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terça-feira, 26 de fevereiro de 2013
RESUMO DO LIVRO O MUNDO DE SOFIA - Taís Elaine Rios Afonso
RESUMO DO LIVRO O MUNDO DE SOFIA
O JARDIM DO ÉDEN
Sofia era uma menina de quase quinze
anos que morava com sua mãe pois o trabalho de seu pai o deixava ausente
boa parte do tempo. Em um dia belo, quando voltava da escola, encontrou
com dois pequenos envelopes brancos, não simultaneamente. Cada um deles
continha uma indagação e elas levaram Sofia a refletir sobre a vida e a
origem do mundo. Também recebeu um cartão-postal que deveria ser
entregue a uma pessoa que ela nem conhecia e a qual o nome era Hilde.
Sofia foi pensar e refletir sobre os
envelopes em um esconderijo no jardim de sua casa. Para ela, ele
representava um mundo à parte, um paraíso particular, como o jardim do
Éden mencionado na Bíblia.
A CARTOLA
O conteúdo do envelope amarelo que Sofia
recebe diz que as pessoas têm preferências por diversos tipos de
assuntos: umas gostam de esporte, outras curtem observar os astros.
Porém existem questões que deveriam interessar a todos como, por
exemplo, saber quem somos e de onde viemos. Essas e muitas outras têm
sido pensadas e discutidas há muito tempo e as explanações para elas
variam de acordo com o contexto histórico.
Hoje em dia também devemos procurar
nossas respostas e é importante conhecermos o que foi dito em outras
épocas para que possamos formar uma opinião própria. O professor de
filosofia também faz referência a um truque mágico onde um coelhinho
branco é tirado de uma cartola preta. Assim, ele quer passar para Sofia a
idéia de que também fazemos parte de um grande mistério e nos comparar
ao coelho com a diferença de que, ao contrário deste, temos consciência
de estarmos participando de um enigma e procuramos explicações para
isso.
No mesmo dia, Sofia recebe um outro
envelope amarelo. Primeiramente, o professor faz uma citação: “a única
coisa de que precisamos para nos tornarmos bons filósofos é a capacidade
de nos admirarmos com as coisas”. Depois diz que os bebês possuem esta
capacidade mas, à medida que crescem, vão perdendo-a. Deste modo,
compara um filósofo a uma criança: tanto um quanto o outro ainda não se
acostumaram com o mundo e não pretendem se acomodar com as coisas.
OS MITOS
No dia seguinte Sofia leu sobre a visão
mitológica do mundo. Os mitos surgiram da necessidade do homem
justificar fenômenos como o crescimento das plantas, as chuvas, os
trovões, etc. Tudo que ocorria aqui na Terra estava intimamente ligado
ao que acontecia no mundo dos deuses. Dessa maneira, secas, epidemias e
outras coisas ruins eram reflexo de que as forças do mal triunfavam
sobre as do bem e o inverso ocorria quando havia fartura e riqueza.
Por volta de 700 a.C. Homero e Hesíodo
registraram por escrito boa parte da mitologia grega. Isso foi
importante, pois agora era possível questioná-la. Xenófanes foi um
filósofo crítico em relação aos mitos pelo fato de seus representantes
terem sido criados à imagem e semelhança das pessoas.
OS FILÓSOFOS DA NATUREZA
A denominação “filósofos da natureza” é
dada aos primeiros pensadores gregos por estes se interessarem pelos
processos naturais. Eles partiram do pressuposto de que sempre existiu
alguma coisa e, vendo as transformações que ocorriam no meio ambiente,
indagavam-se como aquilo era possível. Então, acreditavam que havia uma
substância básica que subjazia a todas essas transformações.
Esses filósofos também tentaram
descobrir leis eternas a partir da observação dos fatos, desconsiderando
as explanações mitológicas. Assim, a filosofia se libertava da religião
e os primeiros indícios de uma forma científica de pensar começavam a
aparecer.
Tales achava que a água era um elemento
de fundamental importância. Dela tudo se originava e a ela tudo
retornava. Anaximandro não pensou como Tales. A seu ver, a Terra era um
entre vários mundos surgidos de alguma coisa, sendo que tudo se
dissolveria nessa “alguma coisa” que ele denominava de infinito. E
finalmente, Anaxímenes (c. 550-526 a.C.) cria que o ar era a substância
básica de todas as coisas. A água seria a condensação do ar e o fogo, o
ar rarefeito. Pensava ainda que se comprimisse mais ainda a água, esta
se tornaria terra.
Para Parmênides, nada podia vir do nada e
nada que existisse poderia se transformar em outra coisa. Era
extremamente racionalista e não confiava nos sentidos. Não acreditava
nem quando via, embora soubesse que a natureza se transformava.
Heráclito pensou que a principal
característica da natureza eram suas constantes transformações. Ele
confiava nos sentidos. Sobre ele, podemos falar ainda que acreditava que
o mundo estava impregnado de constantes opostos: guerra e paz, saúde e
doença, bem mal e que reconhecia haver uma espécie de razão universal
dirigente de todos os fenômenos naturais.
Para acabar com o impasse a que a
filosofia se encontrava, Empédocles (c. 494-434 a.C.) fez uma síntese do
modo de pensar de Heráclito e Parmênides e com isso chegou a uma
evolução do pensamento.
Empédocles acreditava na existência de
mais de uma substância primordial. Para ser mais exato, havia quatro
elementos básicos: terra, ar fogo e água e tudo existente era produto da
junção disso, em proporções diferentes. Achava também que o amor e a
disputa eram duas forças que atuavam na natureza. O amor une e a disputa
separa as coisas.
Anaxágoras (c.500-428 a.C.) declarava
que as coisas eram constituídas por pequenas partículas invisíveis a
olho nu. Estas podiam se dividir, mas mesmo na pequena parte existia o
todo. Ele denominava estas partes minúsculas de sementes ou gérmens.
Também imaginou uma força superior, a inteligência, responsável pela
criação das coisas.
Anaxágoras foi o primeiro filósofo de
Atenas, mas foi expulso da cidade acusado de ateísmo. Interessava-se por
astronomia, explicou que a Lua não possuía luz própria e como surgiram
os eclipses.
DEMÓCRITO
Demócrito (c. 460-370 a.C.) foi o último
filósofo da natureza. Ele imaginou a constituição das coisas por
partículas indivisíveis, minúsculas, eternas e imutáveis e as chamou de
átomos. Estes, a seu ver, possuíam vários formatos, se diferenciavam
entre si e podiam ser reaproveitados. Por exemplo, quando um animal
morresse seus átomos participariam da constituição de outros corpos.
Era justamente por isso que o Lego era o
brinquedo mais genial do mundo. Ele podia ser utilizado para a
construção de vários objetos, ficando a cargo da imaginação das pessoas.
Era resistente e “eterno”, pois em qualquer época, crianças se
interessavam por este tipo de entretenimento.
Demócrito foi um filósofo que valorizou a
razão e as coisas materiais. Não acreditava em forças que interviessem
nos processos naturais. Achava também que sua teoria atômica explicava
nossas percepções sensoriais e que a consciência e a alma também se
constituíam de átomos. Ele não cria numa alma imortal.
O DESTINO
Uma das características dos antigos
gregos era o fato de eles serem fatalistas, isto é, acreditar que tudo
que vai acontecer já está pré-destinado. Para eles, as doenças eram
vistas como um castigo de Deus. Achavam também que os deuses podiam
curar as pessoas, bastando para isso que lhes fosse feito o sacrifício
apropriado.
SÓCRATES
Sofia recebeu a carta do seu professor
de filosofia que pedia desculpas por recusar o convite de ir até a sua
casa conhecê-la pessoalmente. Nela estava seu nome: Alberto Knox. No
entanto, ele a presenteou com uma echarpe de seda. Quando olhou o verso
da carta, viu algumas perguntas e passou algum tempo refletindo sobre
elas. Ela estava em seu esconderijo. Num dado instante, percebeu que
alguém vinha da floresta. Passados alguns instantes, entrou em seu local
secreto um grande cão labrador com um envelope amarelo na boca. Então,
ela descobriu que ele o mensageiro de seu professor. A nova carta falava
da filosofia em Atenas e de Sócrates.
Na cidade de Atenas primeiramente
surgiram os sofistas – homens que criaram uma crítica social. Eles
discutiam sobre o que era natural e o que não era, ou seja, o que era
criado pela sociedade. Sócrates foi contemporâneo dos sofistas. Ele
também se ocupava das pessoas e de suas vidas, levando-as a refletirem
por si mesmas sobre coisas como os costumes, o bem e o mal. Mas ele
diferia dos sofistas por não se considerar um sábio, não cobrava por
seus ensinamentos e tinha a convicção de que nada sabia. Reconhecia que
havia muita coisa além do que podia entender e vivia atormentado em
busca do conhecimento. Sócrates ousou mostrar as pessoas que elas sabiam
muito pouco. Para ele o importante era encontrar um alicerce seguro
para os conhecimentos. Ele era um racionalista convicto. Em 399 a.C. foi
acusado de corromper a juventude e de não reconhecer a existência dos
deuses. Foi julgado, considerado culpado e condenado à morte.
ATENAS
Sofia encontrou mais um dos envelopes
amarelos e desta vez veio uma fita de vídeo. Ela correu para sua casa e
ao colocá-la no aparelho apareceram imagens de uma grande cidade que ela
supôs ser Atenas. Pouco tempo depois, um homem apresentou-se no filme e
começou a falar da capital grega. Era seu professor.
Ele falou a Sofia sobre a Acrópole e seu
significado, sobre os templos e a época áurea de Atenas. Mostrou-lhe
monumentos, o antigo teatro de Dioniso onde se realizavam as comédias e
tragédias gregas, o Areópago, as ruínas da antiga praça do mercado onde
numa época bastante remota concentrava tribunais, edifícios públicos,
comércio, ginásio de esportes, etc.
Porém, ele achava que isso não era o
bastante para Sofia e então, como num passe de mágica, toda a Atenas se
reconstruiu. Todos aqueles edifícios e templos apareceram novos,
intactos. Várias pessoas trajadas de modo diferente andavam pelas ruas.
Nesse momento, seu professor surgiu novamente para a câmera e apresentou
Sofia a Sócrates e Platão. Este lhe fez algumas perguntas par que ela
refletisse depois e, de repente, o filme acabou.
PLATÃO
Platão (427-347 a.C.) foi discípulo de
Sócrates e o acompanhou em sua condenação. Publicou um discurso em
defesa de seu mestre onde revelava o que ele havia dito ao júri. Além
disso, escreveu uma coletânea de cartas e mais de trinta diálogos
filosóficos e fundou sua própria escola de filosofia, que recebeu o nome
de Academia, porque se localizava num bosque denominado Academos, herói
legendário grego.
O projeto filosófico de Platão é baseado
no seu interesse pelo que é eterno e imutável tanto no que se refere à
natureza, quanto à moral e à sociedade. Platão acreditava numa realidade
autônoma por trás do mundo dos sentidos a qual denominou de mundo das
idéias que, a seu ver, continha as coisas primordiais e imagens padrão
referentes a tudo existente.
Platão acreditava na dualidade humana: o
homem possui um corpo (que flui) e uma alma imortal (a morada da
razão). Ele também achava que a alma já existia antes de vir habitar
nosso corpo (ela ficava no mundo das idéias) e que quando passava a
habitá-lo, esquecia-se das idéias perfeitas. Também pensava que a alma
desejava se libertar do homem e isso propiciava um anseio, uma saudade,
que chamou de Eros (amor).
Platão dividiu o corpo humano em três
partes: cabeça (razão), peito (vontade) e baixo-ventre (desejo ou
prazer) e achava que quando elas agiam como um todo se tinha o homem
íntegro, que atingiu a temperança. Imaginava um Estado-modelo dirigido
por filósofos e o constituía como o ser humano onde a cabeça seria os
governantes; o peito (defesa), os sentinelas; e o baixo-ventre, os
trabalhadores. Era extremamente racionalista e cria que tanto homens
quanto mulheres possuíam capacidade de governar, desde que estas
tivessem a mesma formação daqueles.
A CABANA DO MAJOR
Depois de ler sobre Platão, Sofia
permaneceu em seu esconderijo refletindo sobre as idéias deste filósofo.
Era um dia de Domingo e ainda estava bastante cedo. Então, ela resolveu
ir floresta adentro a fim de encontrar seu professor de filosofia, cujo
nome era Alberto Knox.
Sofia seguiu a trilha que cortava a
floresta e, pouco tempo depois, viu um lago e do outro lado, uma cabana.
Ela o atravessou usando um barco a remo. Quando chegou à casa, bateu na
porta e, como ninguém respondeu, resolveu entrar.
Sofia entrou numa sala grande e concluiu
que alguém morava ali, pois havia resquícios de fumaça num velho fogão à
lenha. Viu uma máquina de escrever, alguns livros, dois quadros na
parede (Berkeley e Bjerkely) e um grande espelho com moldura de latão
entre outras coisas. Encontrou também uma tigela com restos de comida o
que significava que quem ali residia possuía um animal. Quando foi ao
quarto viu dois cobertores e sobre eles pêlos amarelos. Então, deduziu
que na cabana moravam Alberto e seu cachorro Hermes.
Antes de sair, Sofia viu uma carteira
sobre a cômoda que ficava abaixo do espelho. Ela a abriu e viu, dentre
outras coisas, uma carteira de estudante de Hilde Knag. Sofia se
assombrou. Quando ia saindo, viu um envelope com seu nome sobre a mesa
e, involuntariamente, o pegou e correu. Porém, um problema lhe esperava:
o barco estava no meio do lago. Então, para retornar à sua casa, ela
teve que dar a volta pela floresta.
No caminho, abriu o envelope que pegara,
leu o seu conteúdo e achou que tinha alguma coisa a ver com o próximo
filósofo, Aristóteles. Ao chegar à casa eram quase onze horas da manhã.
Encontrou sua mãe preocupada e lhe explicou que tinha ido dar uma volta
na floresta, falou da cabana, o barco e o estranho espelho. Sua mãe
então lhe disse que o lugar onde ela havia ido era conhecido pelo nome
de “cabana do major” porque há muitos anos tinha vivido lá um velho
major.
Depois disso, Sofia foi para o seu
quarto e lá pensou sobre tudo que tinha passado. Ficou receosa por haver
entrado na casa de seu professor e então resolveu escrever-lhe uma
carta pedindo desculpas.
ARISTÓTELES
Aristóteles (384-322 a.C.) foi aluno da
Academia de Platão. Era natural da Macedônia e filho de um médico
famoso. Seu projeto filosófico está no interesse da natureza viva. Ele
foi o último grande filósofo grego e também o primeiro grande biólogo da
Europa. Utilizava-se da razão e também dos sentidos em seus estudos.
Criou uma linguagem técnica usada ainda hoje pela ciência e formulou sua
própria filosofia natural.
Aristóteles discordava em alguns pontos
de Platão. Não acreditava que existisse um mundo das idéias abrangedor
de tudo existente; achava que a realidade está no que percebemos e
sentimos com os sentidos, que todas as nossas idéias e pensamentos
tinham entrado em nossa consciência através do que víamos e ouvíamos e
que o homem possuía uma razão inata, mas não idéias inatas.
Para Aristóteles, tudo na natureza
possuía a probabilidade de se concretizar numa realidade que lhe fosse
inerente. Assim, uma pedra de granito poderia se transformar numa
estátua desde que um escultor se dispusesse a esculpi-la. Da mesma
forma, de um ovo de galinha jamais poderia nascer um ganso, pois essa
característica não lhe é inerente.
Aristóteles acreditava que na natureza
havia uma relação de causa e efeito e também acreditava na causa da
finalidade. Deste modo, não queria saber apenas o porquê das coisas, mas
também a intenção, o propósito e a finalidade que estavam por trás
delas. Para ele, quando reconhecemos as coisas, as ordenamos em
diferentes grupos ou categorias e tudo na natureza pertence a grupos e
subgrupos. Ele foi um organizador e um homem extremamente meticuloso.
Também fundou a ciência da lógica.
Aristóteles dividia as coisas em
inanimadas (precisavam de agentes externos para se transformar) e
criaturas vivas (possuem dentro de si a potencialidade de
transformação). Achava que o homem estava acima de plantas e animais
porque, além de crescer e de se alimentar, de possuir sentimentos e
capacidade de locomoção, tinha a razão. Também acreditava numa força
impulsora ou Deus (a causa primordial de todas as coisas).
Sobre a ética, Aristóteles pregava a
moderação para que se pudesse ter uma vida equilibrada e harmônica.
Achava que a felicidade real era a integração de três fatores: prazer,
ser cidadão livre e responsável e viver como pesquisador e filósofo.
Cria também que devemos ser corajosos e generosos, sem aumentar ou
diminuir a dosagem desses dois itens. Aristóteles chamava o homem de ser
político. Citava formas de governo consideradas boas como a monarquia, a
aristocracia e a democracia. Acreditava que sem a sociedade ao nosso
redor não éramos pessoas no verdadeiro sentido do termo.
Para ele, a mulher era “um homem
incompleto”. Pensava que todas as características da criança já estavam
presentes no sêmen do pai. Sendo assim, o homem daria a forma e a
mulher, a substância. Essa visão distorcida predominou durante toda a
Idade Média.
O HELENISMO
O final do séc. IV a.C. até por volta de
400 d.C. marcou um longo período que é conhecido por helenismo, ou
seja, a predominância da cultura grega nos três grandes reinos
helênicos: Macedônia, Síria e Egito. Alexandre foi uma figura importante
nesta época, pois ele conseguiu a derradeira e decisiva vitória sobre
os persas e também uniu o Egito e todo o Oriente, até a Índia, à
civilização grega. A partir de 50 a.C. Roma, que tinha sido província da
cultura grega, assumiu o predomínio militar e começou o período romano
também conhecido como final da Antigüidade.
O helenismo foi marcado pelo rompimento
de fronteiras entre países e culturas. Quanto à religião houve uma
espécie de sincretismo; na ciência, a mistura de diferentes experiências
culturais; e a filosofia dos pré-socráticos e de Sócrates, Platão e
Aristóteles serviu como fonte de inspiração para diferentes correntes
filosóficas as quais veremos algumas agora.
A filosofia cínica foi fundada em Atenas
por Antístenes (discípulo de Sócrates) por volta de 400 a.C. Os cínicos
diziam que a felicidade podia ser alcançada por todos, pois ela não
consistia em luxúria, poder político ou boa saúde e sim em se libertar
disto tudo. Achavam que as pessoas não deviam se preocupar com o
sofrimento (próprio ou alheio) nem com a morte. O principal
representante desta corrente filosófica foi Diógenes (discípulo de
Antístenes).
A filosofia estóica surgiu em Atenas por
volta de 300 a.C. e seu fundador foi Zenão, originário da ilha de
Chipre. Os estóicos consideravam as pessoas como parte de uma mesma
razão universal e isto levou à idéia de um direito universalmente
válido, inclusive para os escravos. Eram monistas (negavam a oposição
entre espírito e matéria) e cosmopolitas. Interessavam-se pela
convivência em sociedade, por política e acreditavam que os processos
naturais (morte, por exemplo) eram regidos pelas leis da natureza e por
isso o homem deveria aceitar deu destino. O imperador romano Marco
Aurélio (121-180), o filósofo e político Cícero (106-43 a.C.) e Sêneca
(4 a.C.-65 d.C.) foram alguns que seguiram o estoicismo.
Aristipo foi aluno de Sócrates. Ele
desenvolveu uma filosofia cujo objetivo era obter para a vida, através
dos sentidos, o máximo possível de satisfação afastando toda e qualquer
forma de sofrimento. Por volta de 300 a.C. Epicuro (341-270 a.C.) fundou
em Atenas a escola dos epicureus que desenvolveu mais ainda a ética do
prazer de Aristipo e a combinou com a teoria atômica de Demócrito.
Epicuro ensinava que o resultado prazeroso de uma ação devia ser
ponderado, por causa dos efeitos colaterais. Achava também que o prazer a
longo prazo possibilitava mais satisfação ao homem. Ele se utilizava da
teoria de Demócrito contra a religião e superstição. Os epicureus quase
não se interessavam pela política e sociedade e sua palavra de ordem
era “Viver o momento”.
O neoplatonismo foi a mais importante
corrente filosófica da Antigüidade. Ela foi inspirada em Platão. O
neoplatônico mais importante foi Plotino (c. 205-270). Ele via o mundo
como algo dividido entre dois pólos: numa extremidade estava a luz
divina, Uno ou Deus. Na outra reinavam as trevas absolutas. A seu ver, a
luz do Uno iluminava a alma, ao passo que a matéria eram as trevas. O
neoplatonismo exerceu forte influência sobre a teologia cristã.
Uma experiência mística significa
experimentar a sensação de fundir sua alma com Deus. É que o “eu” que
conhecemos não é nosso “eu” verdadeiro e os místicos procuravam conhecer
um “eu” maior que pode possuir várias denominações: Deus, espírito
cósmico, universo, etc. No entanto, para chegar a esse estado de
plenitude, é preciso passar por um caminho de purificação e iluminação
através de uma vida simples. Encontram-se tendências místicas nas
maiorias religiões do mundo. Na mística ocidental (judaísmo,
cristianismo e islamismo), o místico diz que seu encontro é com um Deus
pessoal. Na oriental (hinduísmo, budismo e religião chinesa) o que se
afirma é que há uma fusão total com deus, que é o espírito cósmico. É
importante notar que essas correntes místicas já existiam muito antes de
Platão e que pessoas de nossa época têm relatado experiências místicas
como uma forma de experimentar o mundo sob a perspectiva da eternidade.
OS CARTÕES-POSTAIS
Passados alguns dias sem que Sofia nada
recebesse do seu professor de filosofia e como ela estaria livre a
partir da quinta-feira devido a um feriado, aceitou o convite de sua
amiga Jorunn para acampar e escolheu, intencionalmente, um lugar próximo
à cabana do major, pois ela pretendia ir lá novamente.
Chegando ao local, armaram a barraca e
depois de organizarem tudo, fizeram um lanche. Sofia perguntou se Jorunn
já tinha ouvido falar da cabana e convenceu a amiga a ir até lá. Depois
de uma caminhada, avistaram o lago e a casa que parecia estar
abandonada. Utilizaram o barco para irem para o outro lado e, desta vez,
Sofia teve todo o cuidado de puxá-lo.
Quando entraram na casa estava muito
escuro, mas Sofia tinha trazido fósforo e acendeu uma vela que lá havia.
Então, chamou Jorunn para ver o espelho e lhe disse que era um espelho
mágico. Nesse momento, Jorunn descobriu alguma coisa no chão da sala.
Eram cartões-postais. Todos vinham do Líbano e estavam endereçados a
Hilde Knag. Sofia teve certo receio, pois seu nome poderia estar
mencionado nos cartões (Jorunn não sabia sobre o filósofo nem sobre
outros cartões que Sofia recebera ) mas começou a lê-los com a amiga.
Eles falavam do aniversário de quinze anos de Hilde e sobre um
misterioso presente que ela receberia. No entanto, no último cartão
estavam mencionados os nomes de Sofia e Jorunn. Elas ficaram assustadas.
Além disso, ainda havia um detalhe: era dezesseis de maio de mil
novecentos e noventa e o cartão indicava a mesma data. Como aquilo era
possível? Sofia disse que tinha algo a ver com o espelho mágico e Jorunn
achou absurdo, mas não havia outra explicação. Ela ainda mostrou à
amiga os dois quadros na parede — Berkeley e Bjerkely. A vela já estava
quase no fim. Jorunn queria ir embora e Sofia a seguiu mas, antes disso,
resolveu levar o espelho consigo. As duas voltaram para o acampamento
caladas.
Na manhã seguinte, após tomarem café,
conversaram sobre os cartões-postais e caminharam de volta para casa. No
outro dia, pela manhã, Sofia foi até seu esconderijo e encontrou outro
envelope amarelo. Imediatamente começou a ler.
DOIS CÍRCULOS CULTURAIS
A denominação indo-europeus é dada a
todos os países e culturas nos quais são faladas as línguas
indo-européias . Os indo-europeus primitivos viveram a mais ou menos
quatro mil anos nas proximidades dos mares Negro e Cáspio. De lá,
espalharam-se por diversos lugares: Irã, Índia, Grécia, Itália, Espanha,
Inglaterra, França, Escandinávia, Leste Europeu e Rússia, formando o
círculo cultural indo-europeu. Dentre outras coisas, pode-se dizer que
sua cultura era marcada pelo politeísmo, a visão era o principal sentido
para eles e acreditavam que a história era cíclica. As duas grandes
religiões orientais – hinduísmo e budismo – são de origem indo-européia.
O mesmo vale para a filosofia grega. Nessas religiões, enfatiza-se a
presença de Deus em tudo (panteísmo). Outro ponto importante é a crença
de que o homem pode chegar a uma unidade com Deus por meio do
conhecimento religioso. No Oriente, a passividade e a vida reclusa são
vistas como ideais religiosos e em muitas culturas indo-européias
acredita-se na metempsicose ou transmigração da alma.
Os semitas pertencem a um círculo
cultural completamente diferente, com uma língua completamente diferente
também. Eles são originários da península da arábia e também se
expandiram para extensas e diferentes partes do mundo. As três religiões
ocidentais – judaísmo, o cristianismo e o islamismo – têm base semita.
De modo geral, o que se pode dizer dos semitas é que eram monoteístas,
possuíam uma visão linear da história, a audição desempenhava papel
preponderante e proibiam a representação pictórica. Quanto à história, é
interessante saber que, para eles, ela começou com a criação do mundo
por Deus e Este tinha o poder de intervir em seu curso. Em relação às
imagens, ainda são proibidas no judaísmo e no islamismo, mas no
cristianismo são permitidas devido à influência do mundo greco-romano.
Agora vamos examinar o pano de fundo
judeu do cristianismo. A história é a seguinte: houve a criação do mundo
e a rebelação do homem contra Deus (Adão e Eva) e a partir de então, a
morte passou a existir na Terra. A desobediência do homem a Deus
atravessa toda a história contada na Bíblia. No Gênesis há a menção do
pacto feito entre Deus e Abraão e seus descendentes que exigia a
obediência rigorosa aos mandamentos de Deus. Esse pacto foi mais tarde
renovado com a entrega das Tábuas da Lei a Moisés no monte Sinai.
Naquela época, os israelitas viviam havia muito tempo como escravos no
Egito, mas foram libertados e levados de volta a Israel onde se formou
dois reinos – Israel (ao Norte) e Judá (ao Sul) – que foram assolados
por guerras, e por todos os séculos que se seguiram até o nascimento de
Jesus Cristo, os judeus continuaram sob dominação estrangeira. O povo
judeu não entendia o motivo de tanta desgraça e atribuía isso ao castigo
de Deus sobre Israel devido à sua desobediência. Então começaram a
surgir profecias sobre o Juízo Final e também sobre a vinda de um
“príncipe da paz” que iria restaurar o antigo reino de Davi e assegurar
ao povo um futuro feliz. Esse messias viria para restituir a Israel a
sua grandeza e fundar um “Reino de Deus”.
No contexto de toda essa efervescência
nasceu Jesus Cristo. Naquela época, o povo imaginava o messias como um
líder político, militar e religioso. Outros, duzentos anos antes do
nascimento de Jesus, diziam que o messias seria o libertador de todo o
mundo. Mas Jesus apareceu com pregações diferentes das que vigoravam e
admitia publicamente não ser um comandante militar ou político. E mais,
dizia que o Reino de Deus era o amor ao próximo e aos inimigos. Ele não
considerava indigno conversar com prostitutas, funcionários corruptos e
inimigos políticos do povo e achava que estes seriam vistos por Deus
como pessoas justas bastando para isso que se voltassem para Ele e Lhe
pedisse perdão. Jesus acreditava que nós mesmos não podíamos nos redimir
de nossos pecados e que nenhuma pessoa era reta aos olhos de Deus. Ele
foi um ser humano extraordinário. Soube usar de forma genial a língua de
seu tempo e deu a conceitos antigos um sentido novo, extremamente
ampliado. Tudo isto acrescentado a sua mensagem radical de redenção dos
homens ameaçava tantos interesses e posições de poder que ele acabou
sendo crucificado. Para o cristianismo, Jesus foi o único homem justo
que viveu e o único que sofreu e morreu por todos os homens.
Alguns dias depois da crucificação e
enterro de Jesus, começaram a surgir boatos sobre sua ressurreição.
Pode-se dizer que a Igreja cristã começou naquela manhã de Páscoa. Paulo
disse: “Pois se Cristo não ressuscitou, então todo nosso sermão é vão; é
vã toda a vossa crença”. A partir de então todas as pessoas podiam ter
esperança na “ressurreição da carne”. Os primeiros cristãos começaram a
espalhar a “boa-nova” da redenção pela fé em Cristo. Poucos anos depois
da morte de Jesus, o fariseu Paulo se converteu ao cristianismo e suas
viagens missionárias pelo mundo greco-romano transformaram o
cristianismo numa religião universal. Quando esteve em Atenas, ele fez
um discurso do Areópago que falava do Deus que os atenienses
desconheciam e isso provocou um choque entre a filosofia grega e a
doutrina da redenção cristã. Apesar de tudo, Paulo encontrou nessa
cultura um sólido apoio, ao chamar atenção para o fato de que a busca
por Deus estava dentro de todos os homens. Em Atos dos Apóstolos está
escrito que depois de seu discurso, foi vítima de zombaria por parte de
algumas pessoas, quando estas o ouviram dizer que Cristo havia
ressuscitado dos mortos. Mas também houve os que se interessaram pelo
assunto. Depois, Paulo prosseguiu em sua tarefa missionária e passadas
algumas décadas da morte de Cristo já existiam comunidades cristãs em
todas as cidades gregas e romanas mais importantes.
Paulo não foi importante para o
cristianismo apenas por suas pregações missionárias. Dentro das
comunidades cristãs, sua influência era muito grande pois as pessoas
também queriam uma orientação espiritual. Pelo fato de o cristianismo
não ser a única religião nova daquela época, a Igreja precisava definir
claramente a doutrina cristã, a fim de estabelecer seus limites em
relação às demais religiões e evitar uma cisão interna. Surgiram assim
as primeiras profissões de fé, os primeiros credos que resumiam os
princípios ou os dogmas cristãos mais importantes como o que dizia que
Jesus havia sido Deus e homem ao mesmo tempo e de forma plena e que
realmente tinha padecido na cruz.
A IDADE MÉDIA
Sofia recebeu um telefonema de Alberto
dizendo que de agora em diante não haveria mais cartas. Ele marcou um
encontro para lhe falar sobre a Idade Média. Disse que o pai de Hilde já
estava fechando o cerco e que precisavam batalhar juntos. Sofia não
entendeu nada. Eles se encontraram numa igreja antiga construída na
época medieval. Era de madrugada. Quando Sofia chegou lá ficou a espera
de seu professor. Passados alguns instantes ele entrou vestido de monge e
começou a falar sobre a Idade Média. Dentre outras coisas disse que na
Idade Média se formou uma unidade cultural cristã sólida. Havia uma
contradição entre Deus e razão. Essa problemática foi tratada por dois
importantes filósofos desta época: Santo Agostinho e Santo Tomás de
Aquino. O primeiro dividiu o mundo entre bem e mal, mesclou sua
concepção filosófica com a de Platão e a do cristianismo (“cristianizou
Platão”); achava que o mal era a ausência de Deus e que a “boa vontade
era obra de Deus”. O segundo foi o filósofo quem “cristianizou
Aristóteles”. Atribui-se a ele o mérito de ter conseguido fazer uma
síntese da fé e do conhecimento. Achava que existiam dois caminhos para
se chegar a Deus: a revelação cristã e a razão e os sentidos. Acreditava
que Deus havia se revelado ao homem através da Bíblia e da razão.
O RENASCIMENTO
Na noite seguinte Sofia teve um sonho
com Hilde. Ao acordar, achou uma corrente de ouro com uma cruz. No seu
verso estavam grafadas três letras: HMK, as iniciais de Hilde. No outro
dia, Domingo, Sofia viu Hermes no jardim de sua casa e foi até ele que a
conduziu para um casarão onde encontrou um cartão destinado a Hilde com
a data antecipada. Lá, encontrou também Alberto. Então ele lhe deu
explicações sobre o Renascimento.
Entende-se por Renascimento um período
de apogeu cultural que fez nascer de novo a arte e a cultura da
Antigüidade. Neste período, o homem voltou a ocupar o centro de todas as
coisas (antropocentrismo) ao contrário do que ocorria na Idade Média
(teocentrismo). Por isso fala-se do humanismo do renascimento. A Igreja
aos poucos foi perdendo seu poder e monopólio no que se refere à
transmissão do conhecimento. A moda naquela época era tornar o ser
humano algo grandioso e valioso. O humanismo do renascimento foi muito
marcado pelo individualismo. A nova visão do homem centrava-se no
interesse pela anatomia e nas representações dos nus humanos. O homem, a
partir desta concepção, não existia apenas para servir a Deus, mas a
ele próprio. Vale ressaltar que no Renascimento desenvolveu-se um novo
método científico – o princípio vigente era o da investigação da
natureza mediante a observação e a experimentação – método empírico.
O BARROCO
Durante alguns dias, Sofia não teve
notícias de Alberto. Numa conversa com sua mãe, disse que queria uma
festa em seu aniversário. Ela continuou recebendo os cartões-postais
mandados pelo pai de Hilde. A cada dia percebia que estava diante de um
enigma. Então, foi novamente ver Alberto. Quando chegou a sua casa ele
lhe disse que queria falar-lhe sobre o séc. XVII, ou seja, sobre a época
conhecida por barroco.
A designação barroco tem sua origem numa
palavra que significa “pérola irregular.” Na arte do barroco houve a
valorização das formas opulentas, cheias de contrastes. Em muitos
aspectos, o barroco foi marcado pela vaidade e pela irracionalidade. Do
ponto de vista político, o séc. XVII foi uma época de contrastes: de um
lado guerras e de outro o surgimento de potências na Europa como a
França. No aspecto social, a principal característica foram as
diferenças de classes. A arquitetura trazia formas sobrecarregadas de
ornamentos que ocultavam as linhas da estrutura. Um correlato disso na
política seriam os assassinatos, as intrigas e as conspirações. Dentre
os principais representantes desta época destacam-se: William
Shakespeare, o poeta dramático espanhol, Calderón de la Barca e Ludvig
Holdberg (já trazia traços do Iluminismo).
DESCARTES
René Descartes nasceu em 1596. Ele foi
uma pessoa que se dedicou muito a viagens pela Europa e pode-se dizer
que foi o fundador da filosofia dos novos tempos e o primeiro grande
construtor de um sistema filosófico que foi seguido por Spinoza e
Leibniz, Locke e Berkeley, Hume e Kant. Sistema filosófico é uma
filosofia de base cujo objetivo é encontrar respostas para as questões
filosóficas mais importantes. Uma coisa que ocupou a atenção de
Descartes foi a relação, entre corpo e alma. Sua obra mais importante éDiscurso do método,
onde explica, entre outras coisas, que não se deve considerar nada como
verdadeiro. Ele queria aplicar o método matemático à reflexão da
filosofia e provar as verdades filosóficas como se prova um princípio de
matemática, ou seja, empregando a razão. Em seu raciocínio, Descartes
objetiva chegar a um conhecimento seguro sobre a natureza da vida e
afirma que para tanto deve-se partir da dúvida. Ele achava importante
descartar primeiro todo o conhecimento constituído antes dele, para só
então começar a trabalhar em seu projeto filosófico. Achava também que
não devíamos confiar em nossos sentidos. Era, portanto, racionalista.
Uma das conclusões a que chegou foi a de que a única coisa sobre a qual
se podia ter certeza era a de que duvidava de tudo. Acreditava na
existência de Deus como algo tão evidente quanto o fato de que alguém
que pensa era um ser, um Eu presente. Achava que o homem era um ser
dual: tanto pensa como ocupa lugar no espaço. Descartes morreu aos 54
anos, mas mesmo após sua morte continuou a ser uma figura de grande
importância para a filosofia. Ele foi um homem à frente de seu tempo.
SPINOZA
Baruch Spinoza foi um filósofo holandês
que recebeu influências de Descartes. Ele pertencia à comunidade judaica
de Amsterdã, mas foi excomungado por heresia. Contestava o fato de que
cada palavra da Bíblia fosse inspirada por Deus e dizia que quando a
lemos temos que fazê-lo com uma postura crítica. Com essa forma de
pensar, foi sendo isolado por todos, até por sua família. Seu sustento
provinha do polimento de lentes e isso tem um significado simbólico,
pois a tarefa de um filósofo é justamente ajudar as pessoas a ver a vida
de um modo novo. Em sua filosofia é fundamental enxergar as coisas
sobre a perspectiva da eternidade.
Spinoza era panteísta, ou seja, achava
que Deus estava presente em tudo que existia. Em relação à ética, ele a
entendia como a doutrina de como se deve viver para ter uma boa vida.
Também era racionalista e pretendeu mostrar que a vida do homem é
governada pelas leis da natureza. Achava que o homem tinha que se
libertar de seus sentimentos e sensações para só então encontrar a paz e
ser feliz. Ele era monista (acreditava somente numa natureza material,
física). Spinoza considerava Deus, ou as leis da natureza, a causa
interna de tudo o que acontecia. Ele tinha uma visão determinista. Ele
defendeu de forma enérgica a liberdade de expressão e a tolerância
religiosa.
LOCKE
Passaram-se duas semanas sem que Sofia
tivesse contato com Alberto, mas quando vinha da escola encontrou Hermes
no jardim de sua casa e o acompanhou até a residência de seu professor.
Quando lá chegou, relembrou com ele o que tinham discutido na última
vez em que estiveram juntos. Então começaram com o estudo sobre Locke,
um filósofo da experiência ou empírico. Antes, porém, falaram do
racionalismo e de seus principais representantes no séc. XVII que foram o
francês Descartes, o holandês Spinoza e o alemão Leibniz. Um empírico
deriva todo o seu conhecimento daquilo que lhe dizem os sentidos. A
formulação clássica de uma postura empírica vem de Aristóteles. Locke
repetiu as palavras deste filósofo, mas o destinatário de sua crítica
foi Descartes. John Locke (1632-1704) foi o primeiro filósofo empírico
inglês. Seu livro mais importante chama-se Um ensaio sobre o entendimento humano.
Nele, Locke tentava explicar duas questões: em primeiro lugar, de onde o
homem retirava seus pensamentos e suas noções; em segundo, se podíamos
confiar no que nossos sentidos nos dizem.
Locke acreditava que todos os nossos
pensamentos e nossas noções nada mais eram do que um reflexo daquilo que
um dia já sentimos ou percebemos através de nossos sentidos. Antes de
sentirmos qualquer coisa nossa mente era como uma tábula rasa, uma lousa
vazia. Ele estabeleceu a diferença entre aquilo que se chama de
qualidades sensoriais primárias e secundárias. Por qualidades sensoriais
primárias Locke entendia a extensão, peso, forma, movimento e número
das coisas. As secundárias eram as que não reproduziam as
características verdadeiras das coisas e sim o efeito que essas
características exteriores exerciam sobre os nossos sentidos. Locke
chamou a atenção para o conhecimento intuitivo ou demonstrativo. Ele
acreditava que certas diretrizes éticas valiam para todos e que era
inerente à razão humana saber da existência de um Deus.
HUME
David Hume viveu de 1711 a 1776. Sua
filosofia é considerada até hoje como a mais importante filosofia
empírica. Ele achava que lhe cabia a tarefa de eliminar todos os
conceitos obscuros e os raciocínios intricados criados até então. Hume
queria retornar à forma original pela qual o homem experimentava o
mundo. Constatou que o homem possuía impressões de um lado, e idéias, de
outro e atentou para o fato de que tanto uma quanto outra poderiam ser
ou simples ou complexas. Ele se preocupou com o fato de às vezes
formarmos idéias e noções complexas, para as quais não há
correspondentes complexos na realidade material. Era dessa forma que
surgiam as concepções falsas sobre as coisas. Ele estudou cada noção,
cada idéia, a fim de verificar se sua composição encontrava correlato na
realidade. Ele achava que uma noção complexa precisava ser decomposta
em noções menores. Era assim que pretendia chegar a um método científico
de análise das idéias do homem. No âmbito da ética e da moral, Hume se
opôs ao pensamento racionalista. Os racionalistas consideravam uma
qualidade inata da razão humana o fato de ela poder distinguir entre o
certo e o errado. Hume, porém, não acreditava que a razão determinasse
as ações e pensamentos de uma pessoa.
BERKELEY
George Berkeley (1685-1753) foi um bispo
irlandês. Ele cria que a filosofia e a ciência de seu tempo constituíam
uma ameaça para a visão cristã do mundo. Além disso, achava que o
materialismo, cada vez mais consistente e difundido, colocava em risco a
crença cristã de que Deus criou e mantém vivo tudo existente na
natureza. Ao mesmo tempo, porém, Berkeley foi um dos mais coerentes
representantes do empirismo. Ele dizia que tudo que existia era só o que
percebíamos e que aquilo que percebíamos não era matéria ou substância.
Acreditava também que todas as idéias tinham uma causa fora da
consciência, mas que esta causa não era de natureza material e sim de
natureza espiritual. Segundo Berkeley, portanto, a alma podia ser a
causa das próprias idéias, mas só outra vontade, só outro espírito podia
ser a causa das idéias que formavam o mundo material. Ele dizia que
tudo vinha do espírito “onipotente por meio do qual tudo existia”.
Afirmava que tudo que víamos e sentíamos era um efeito da força de Deus,
pois Ele estava presente no fundo de nossa consciência e era a causa de
toda a multiplicidade de idéias e sensações a que estávamos
constantemente sujeitos. Este espírito, no qual tudo existia era o Deus
cristão.
BJERKELY
Hilde Knag acordou na mansarda da antiga
casa do capitão, nas proximidades de Lillesand. Levantou-se e foi até a
janela. Eram 15 de junho de 1990, o dia de seu aniversário de quinze
anos. Então, lembrou-se de que seu pai estaria de volta do Líbano em uma
semana. Na janela, ela observou o jardim, o ancoradouro e a casa de
barcos pintada de vermelho. Olhou para o lago e se recordou de que uma
vez caíra nele quando tinha seis ou sete anos por tentar atravessá-lo
sozinha no barco. Hilde tinha cabelos loiros e levemente ondulados e
olhos verdes. Quando olhou para o criado-mudo viu que sobre ele havia um
grande pacote, embrulhado num papel de presente e deduziu que era o
presente de seu pai. Havia muitas folhas datilografadas e na primeira
página estava o título O MUNDO DE SOFIA. Hilde acomodou-se na sua cama e
começou a ler. Teve um susto quando leu que Sofia recebera
cartões-postais do Líbano, endereçados a ela. Em vez de colocar os
cartões dentro do pacote seu pai tinha escrito a mensagem de “feliz
aniversário” dentro do próprio presente. Então, continuou a ler e não
conseguia mais parar. A parte em que Sofia achou a cabana chamou
bastante a atenção de Hilde principalmente no tocante ao espelho, pois
ele realmente existia em sua casa. A cada capítulo lido, Hilde tinha a
convicção de que Sofia não era apenas uma personagem fictícia e que
talvez ela existisse.
ILUMINISMO
O iluminismo foi um movimento que
caracterizou o pensamento europeu do século XVIII, baseado na crença do
poder da razão e do progresso, na liberdade de pensamento e na
emancipação política. Muitos dos filósofos do iluminismo francês tinham
visitado a Inglaterra, que em certo sentido era mais liberal do que a
França. A ciência natural inglesa encantou esses filósofos franceses. De
volta a sua pátria, a França, eles começaram pouco a pouco a se rebelar
contra o autoritarismo vigente e não tardou muito a se voltarem também
contra o poder da Igreja, do rei e da aristocracia. Eles começaram a
reimplantar o racionalismo em sua revolução. A maioria dos filósofos do
Iluminismo tinha uma crença inabalável na razão humana. A nova ciência
natural deixava claro que tudo na natureza era racional. De certa forma,
os filósofos iluministas consideravam sua tarefa criar um alicerce para
a moral, a ética e a religião que estivesse em sintonia com a razão
imutável do homem. Todos esses fatores contribuíram para a formação do
pensamento do iluminismo francês. Os filósofos desta época diziam que só
quando a razão e o conhecimento se difundissem era que a humanidade
faria grandes progressos. A natureza para eles era quase a mesma coisa
que a razão e por isso enfatizavam um retorno de homem a ela. Falavam
também que a religião deveria estar em consonância com a razão natural
do homem. O iluminismo foi o alicerce para a Revolução Francesa de 1789.
KANT
Immanuel Kant nasceu em Königsberg, uma
cidade da Prússia Oriental, em 1724. Ele conheceu muitos filósofos
racionalistas e empíricos. Achava que tanto os sentidos quanto a razão
eram muito importantes para a experiência do mundo e concordava com Hume
e com os empíricos quanto ao fato de que todos os conhecimentos
deviam-se às impressões dos sentidos. Mas, e nesse ponto ele concordava
com os racionalistas, a razão também continha pressupostos importantes
para o modo como o mundo era percebido. Kant explicava que o espaço e o
tempo pertenciam à condição humana sendo propriedades da consciência, e
não atributos do mundo físico. Ele afirmava que a consciência se
adaptava às coisas e vice-versa acreditava que a lei da causalidade era o
elemento componente da razão humana e que era eterna e absoluta,
simplesmente porque a razão humana considerava tudo o que acontecia
dentro de uma relação de causa e efeito. Ele atentou para o fato de
haver limites bem claros para o que o homem podia saber e achava que o
ser humano jamais poderia chegar a um conhecimento seguro a respeito da
existência de Deus, de que o universo era ou não infinito, etc. Outro
pensamento de Kant era o de que a razão operava fora dos limites daquilo
que os seres humanos poderiam compreender. Existiam dois elementos que
contribuíam para o conhecimento do mundo: a experiência e a razão.
Achava que o material para o conhecimento era dado através dos sentidos
que se adaptava, por assim dizer, às características da razão.
O ROMANTISMO
O Romantismo começou na Alemanha, em
fins do século XVIII, como uma reação à parcialidade do culto à razão
apregoado pelo iluminismo e durou até meados do século passado. Suas
palavras de ordem eram: sentimento, imaginação, experiência e anseio. No
Romantismo, o indivíduo encontrava caminho livre para fazer sua
interpretação e professava uma glorificação quase irrestrita do “eu”. Os
românticos acreditavam que só a arte era capaz de aproximar alguém do
indizível. Alguns levaram essa reflexão às últimas conseqüências e
chegaram a comparar o artista com Deus. Costumava-se dizer que o artista
possuía uma espécie de imaginação criadora do mundo e em seu êxtase
artístico seria capaz de experimentar um estado em que as fronteiras
entre sonho e realidade desapareceriam. Os românticos sentiam-se
atraídos pela noite, pelo crepúsculo, por antigas ruínas e pelo
sobrenatural. Interessavam-se muito pelo que se chama de lado oculto da
vida: o obscuro, o misterioso, o místico. O Romantismo foi sobretudo um
fenômeno urbano. Precisamente na primeira metade do século passado, a
cultura urbana vivia um período de apogeu em muitas regiões da Europa.
Dizia-se que, para o artista a ociosidade era o ideal e a indolência, a
primeira virtude do romântico e que era seu dever viver a vida, ou
imaginar-se distante dela. Uma das características mais importantes
deste período era o amor pela natureza e por sua mística. O Romantismo
também foi uma reação à visão do mundo mecanicista do iluminismo. Isto
significa que a natureza voltou a ser vista como um todo, como uma
unidade. Devido ao fato de o Romantismo ter trazido consigo uma
reorientação em tantos setores, costuma-se distingui-lo de duas formas:
Romantismo Universal e o Nacional. No primeiro, os românticos se
preocupavam com a natureza, a alma do mundo e com o gênio artístico. No
segundo, eles interessavam-se sobretudo pela história do povo, sua
língua e também pela cultura popular.
KIERKEGAARD
Kierkegaard nasceu em Copenhague em
1813. Ele se opôs intensamente aos pensamentos de Hegel, o próximo
filósofo a ser estudado, e disse que a filosofia da unidade dos
românticos e o historicismo de Hegel tinham tirado do indivíduo a
responsabilidade pela sua própria vida. Para Kierkegaard, mais
importante do que a busca de uma verdade era a busca por verdades que
são importantes para a vida de cada indivíduo. Ele dizia também que a
verdade era subjetiva não no sentido de que era totalmente indiferente o
que pensamos ou aquilo em que acreditamos, mas que as verdades
realmente importantes eram pessoais. Kierkegaard achava que havia três
possibilidades diferentes de existência e as denominou de estágio
estético, estágio ético e estágio religioso. Quem vive no estágio
estético vive o momento e visa sempre o prazer. O estágio ético é
marcado pela seriedade e por decisões consistentes, tomadas segundo
padrões morais. Quem vive no estágio religioso prefere a fé ao prazer
estético e aos mandamentos da razão. Para Kierkegaard, o estágio
religioso era o cristianismo.
HEGEL
Georg Wilhelm Friedrich Hegel nasceu em
1770, em Stuttgart. Ele reuniu e desenvolveu quase todos os pensamentos
surgidos entre os românticos. Hegel também empregou o conceito espírito
do mundo, mas lhe atribuiu um sentido diferente do de outros românticos.
Quando falava de espírito ou razão do mundo, ele estava se referindo à
soma de todas as manifestações humanas. Ele dizia que a verdade era
basicamente subjetiva e contestava a possibilidade de haver uma verdade
acima ou além da razão humana. Achava também que as bases do
conhecimento mudavam de geração para geração e, por conseqüência, não
existiam verdades eternas. Ele dizia que a razão era algo dinâmico e que
fora do processo histórico não existia qualquer critério capaz de
decidir sobre o que era mais verdadeiro e o que era mais racional.
Acreditava que quando se refletia sobre o conceito de “ser” não tinha
como deixar de lado a reflexão da noção oposta, ou seja, o “não ser” e
que a tensão entre esses dois conceitos era resolvida pela idéia de
transformar-se. Hegel atribuiu uma importância enorme àquilo que chamou
de forças objetivas: a família e o Estado. Ele achava que o indivíduo
era a parte orgânica de uma comunidade e que a razão ou o espírito do
mundo só se tornavam possíveis na interação das pessoas e dizia também
que o Estado era mais que o cidadão isolado e mais que a soma de todos
os cidadãos. Hegel achava impossível desligar-se da sociedade por assim
dizer. Para ele, quem dava as costas à sociedade na qual vivia e
preferia encontrar-se a si mesmo era um louco. Ele falava que não era o
indivíduo que encontrava a si mesmo, mas o espírito do mundo e tentou
mostrar que este retorna a si em três estágios: em primeiro lugar, o
espírito do mundo se conscientiza de si mesmo no indivíduo (chama-se de
razão subjetiva); depois, atinge um nível mais elevado de consciência na
família, na sociedade e no Estado, (chama-se de razão objetiva); e
enfim atinge a forma mais elevada de autoconhecimento na razão absoluta.
E esta razão absoluta eram a arte, a religião e a filosofia, sendo esta
última a mais elevada da razão. Só na filosofia era que o espírito do
mundo se encontraria. Desse ponto de vista, a filosofia podia ser
considerada o espelho do espírito do mundo.
MARX
Marx foi um filósofo materialista e seu
pensamento tinha um objetivo prático e político. Foi também um
historiador, sociólogo e economista. Ele achava que eram as condições
materiais de vida numa sociedade que determinavam o pensamento e a
consciência e que tais condições eram decisivas também para a evolução
da história. Nesse sentido, Marx dizia que não eram os pressupostos
espirituais numa sociedade que levavam a modificações materiais, mas
exatamente o oposto: as condições materiais determinavam, em última
instância, também as condições espirituais. Além disso, achava que as
forças econômicas eram as principais responsáveis pela mudança em todos
os outros setores e, conseqüentemente, pelos rumos do curso da história.
Para Marx, as condições materiais sustentavam todos os pensamentos e
idéias de uma sociedade sendo esta composta por três camadas: embaixo de
tudo estavam as condições naturais de produção que compreendiam os
recursos naturais; a próxima camada era formada pelas forças de produção
de uma sociedade, que não era só a força de trabalho do próprio homem,
mas também os tipos de equipamentos, ferramentas e máquinas, os chamados
meios de produção; a terceira trata das relações de posse e da divisão
do trabalho, chamada de relações de produção de uma sociedade. Para ele,
o modo de produção determinava se relações políticas e ideológicas
podiam existir. Marx falava que toda a história era a história das lutas
de classes. Pensava a respeito do trabalho humano falando que quando o
homem labutava, ele interferia na natureza e deixava nela suas marcas e
vice-versa. Marx foi a pessoa que deu grande impulso ao comunismo. Ele
atacava fortemente o sistema capitalista que vigorava em todo mundo e
achava que seu modo de produção era contraditório. Para ele, o
capitalismo era um sistema econômico autodestrutivo, sobretudo porque
lhe faltava um controle racional. Ele considerava o capitalismo
progressivo, isto é, algo que aponta para o futuro, mas só porque via
nele um estágio a caminho do comunismo.
Segundo Marx, quando o capitalismo
caísse e o proletariado tomasse o poder, haveria o surgimento de uma
nova sociedade de classes, na qual o proletariado subjugaria à força a
burguesia. Esta fase de transição Marx chamou de ditadura do
proletariado. Depois disso a ditadura do proletariado daria lugar a uma
sociedade sem classes, o comunismo e esta seria uma sociedade na qual os
meios de produção pertenceriam a todos. Em tal estágio, cada um
trabalharia de acordo com sua capacidade e ganharia de acordo com suas
necessidades.
DARWIN
Darwin foi um cientista que, mais do que
qualquer outro em tempos mais modernos, questionou e colocou em dúvida a
visão bíblica sobre o lugar do homem na criação. Ele achava que
precisava se libertar da doutrina cristã sobre o surgimento do homem e
dos animais, vigente em sua época. Darwin nasceu em 1809 na cidade de
Shrewsbury. Em um de seus livros publicados, Origem das espécies,
defendeu duas teorias ou idéias principais: em primeiro lugar dizia que
todas as espécies de plantas e animais existentes descendiam de formas
mais primitivas, que viveram em tempos passados. Ele pressupôs,
portanto, uma evolução biológica. Em segundo, Darwin explicou que esta
evolução se devia à seleção natural. Um dos argumentos propostos por ele
para a evolução biológica era o fato de existir depósitos de fósseis
estratificados em diferentes formações rochosas. Outro argumento era a
distribuição geográfica das espécies vivas (ele havia visto com seus
próprios olhos que as diferentes espécies de animais de uma região
distinguiam-se umas das outras por detalhes mínimos). Darwin não
acreditava que as espécies eram imutáveis, só que lhe faltava uma
explicação convincente para o modo como se processava a evolução. O que
ele tinha era um argumento para a suposição de que todos os animais da
Terra possuíam um ancestral comum: a evolução dos embriões dos
mamíferos, mas continuava sem explicar como se processava a evolução
para as diferentes espécies. Enfim chegou a uma conclusão: a responsável
era a seleção natural na luta pela vida, ou seja, quem melhor se
adaptava ao meio ambiente, sobrevivia e podia garantir a continuidade de
sua espécie. “As constantes variações entre indivíduos de uma mesma
espécie e as elevadas taxas de nascimento constituem a matéria-prima
para a evolução da vida na Terra. A seleção natural na luta pela
sobrevivência é o mecanismo, a força propulsora que está por trás desta
evolução. A seleção natural é responsável pela sobrevivência dos mais
fortes, ou dos que melhor se adaptam ao seu meio”.
FREUD
Freud nasceu em 1856 e estudou medicina
na Universidade de Viena. Ele achava que sempre havia uma tensão entre o
homem e o seu meio. Para ser mais exato, um conflito entre o próprio
homem e aquilo que o seu meio exigia dele. Ele descobriu o universo dos
impulsos que regiam a vida do ser humano. Com freqüência, impulsos
irracionais determinavam os pensamentos, os sonhos e as ações das
pessoas. Tais impulsos irracionais eram capazes de trazer à luz
instintos e necessidades que estavam profundamente enraizados no
interior dos indivíduos. Freud chegara a conclusão da existência de uma
sexualidade infantil por meio de sua prática como psicoterapeuta. Ele
também constatou que muitas formas de distúrbios psíquicos eram devido a
conflitos ocorridos na infância. Após um longo período de experiência
com pacientes, concluiu que a consciência seria mais ou menos como a
ponta de um iceberg que se elevava para além da superfície da água. Sob a
superfície ou sob o limiar da consciência, estava o subconsciente ou
inconsciente. A expressão inconsciente significava, para Freud, tudo o
que reprimimos.
NOSSO PRÓPRIO TEMPO
Hilde estava gostando bastante do
presente que ganhara de seu pai e não parava a leitura por nada.
Esquecia-se até de comer. Ela refletia sobre tudo que lia e sempre
chegava a conclusões que às vezes nem entendia. Então voltou a ler.
Sofia estava voltando para casa e no meio do caminho lhe aconteceram
coisas estranhas. Quando chegou a sua casa, passaram alguns instantes
até que sua mãe retornasse também. As duas foram limpar o jardim para a
festa de
Sofia. Na manhã seguinte, Alberto ligou e marcou um encontro no “Café Pierre” para falar sobre o existencialismo.
O existencialismo tem como ponto de
partida única e exclusivamente o homem. Vale ressaltar que todos os
filósofos existencialistas eram cristãos. Jean-Paul Sartre foi um de
seus principais representantes. Ele ainda fez um comentário sobre a
revolução tecnológica por que o mundo passava.
Depois dessa explicação, foram até uma biblioteca que ficava ali perto e Alberto deu de presente a Sofia um livro.
A FESTA NO JARDIM
Hilde já estava quase no final do livro.
Ela sentia que tinha prendido muita coisa desde que começara a ler O
Mundo de Sofia. Ela prosseguiu com a leitura. Sofia pegou um ônibus para
voltar par casa e por coincidência sua mãe estava nele. Quando chegaram
ao seu destino, desceram e passaram o resto do dia organizando e
terminando os preparativos para a festa. Entre os que viriam, estava
Alberto. Os convidados começaram a chegar. Vieram Jorunn e seus pais e
alguns colegas do colégio onde Sofia estudava. Todos estavam ansiosos
pela chegada do já comentado professor de filosofia de Sofia. Então ele
chegou e fez um discurso que contava tudo que estava ocorrendo. Falou
sobre Hilde e seu pai e que tudo que estava acontecendo e a existência
de todos que estavam ali não passava de uma brincadeira inventada para
divertir Hilde no dia de seu aniversário. Os pais de Jorunn acharam
aquilo absurdo e a mãe de Sofia não estava entendendo nada. Então Sofia
contou-lhes que teria que ir embora com Alberto. Sua mãe, mesmo triste,
aceitou e os dois sumiram pela floresta.
O CONTRAPONTO
Hilde refletiu sobre o que havia
acontecido e ficou curiosa para saber onde os protagonistas daquela
história teriam ido parar, o que realmente tinha acontecido, mas a
história tinha acabado. Será que a própria Hilde agora deveria continuar
a história? Então, de repente, ocorreu-lhe uma idéia: se Alberto e
Sofia realmente tinham conseguido fugir da história, não poderia haver
nada escrito sobre isto nas páginas do fichário. Afinal tudo que estava
escrito ali era do conhecimento de seu pai. Nos dias seguintes que se
passaram, ela e sua mãe foram preparar a festa de São João, que seria no
Sábado. Sofia e Alberto conseguiram escapar do livro e agora estavam em
outro local como se fossem almas ou espíritos.
Quando o pai de Hilde chegou ao
aeroporto, encontrou várias mensagens como as que ele mandava para
Sofia. Era sua filha pregando-lhe uma peça e enquanto isso Sofia e
Alberto estavam indo para Lillesand para a residência de Hilde. Durante
este percurso eles perceberam que estavam fazendo parte de outro mundo,
uma espécie de mundo da eternidade..
Hilde esperava o seu pai no jardim onde
também já se encontravam Sofia e Alberto. Eles estavam invisíveis.
Quando o Major Albert Knag (este era o nome do pai de Hilde) chegou, deu
um grande abraço em sua filha e foram jantar. Depois, os dois foram
para o jardim conversar.
A GRANDE EXPLOSÃO
Hilde escutava atentamente seu pai falar
sobre o universo. Sofia e Alberto também estavam ali, ouvindo tudo. Seu
pai lhe falou sobre a origem do universo, a teoria do Big Bang, que foi
uma grande explosão cósmica ocorrida há bilhões de anos atrás, sobre
astronomia, gravidade, inércia e falou que na noite de Ano Novo antes
dele viajar para o Líbano foi que decidira escrever-lhe o livro de
filosofia. Hilde estava encantada.
Enquanto isso, Alberto e Sofia, que
estavam perto do lago, foram até o barco e o soltaram. Hilde não
entendeu e então se lembraram do episódio do livro em que Sofia toma
emprestado o bote de seu professor e resolveram nadar juntos até o
barco.
Autor: Taís Elaine Rios Afonso
(Texto disponível em http://www.pedagogiaaopedaletra.com.br/posts/resumo-do-livro/ )
(Texto disponível em http://www.pedagogiaaopedaletra.com.br/posts/resumo-do-livro/ )
O que é Filosofia e por que vale a pena estudá-la - A.C.Ewing
O que é Filosofia e por que vale a pena estudá-la
Notas
Bibliografia
A. C. Ewing
SEÇÃO INTRODUTÓRIA: A ORIGEM DO TERMO FILOSOFIA
Uma definição precisa do termo
“filosofia” é impraticável. Tentar formulá-la poderia, ao menos de
início, gerar equívocos. Com alguma espirituosidade, alguém poderia
defini-la como “tudo e nada, tudo ou nada…”. Melhor dizendo, a filosofia
difere das ciências especiais na medida em que procura oferecer uma
imagem do pensamento humano – ou mesmo da realidade, até onde se admite
que isso possa ser feito — como um todo. Contudo, na prática, o conteúdo
de informação real que a filosofia acrescenta às ciências especiais
tende a desvanecer-se até parecer não deixar vestígios. Acreditamos que
esse desvanecimento seja enganoso. Mas devemos admitir que até aqui a
filosofia não tem conseguido realizar suas grandes pretensões. Tampouco
tem logrado êxito em produzir um corpo de conhecimentos consensual
comparável ao elaborado pelas diversas ciências. Isso se deve em parte,
embora não integralmente, ao fato de que, quando obtemos conhecimento
verdadeiro a respeito de determinada questão situamos essa questão como
pertencente à ciência e não à filosofia. 0 termo “filósofo” significava
originariamente “amante da sabedoria”, tendo surgido com a famosa
réplica de Pitágoras aos que o chamavam de “sábio”. Insistia Pitágoras
em que sua sabedoria consistia unicamente em reconhecer sua ignorância,
não devendo portanto ser chamado de “sábio”, mas apenas de “amante da
sabedoria”. Nessa acepção, “sabedoria” não se restringia a qualquer dos
domínios particulares do pensamento e, de modo similar, “filosofia” era
usualmente entendida como incluindo o que hoje denominamos “ciência”.
Esse uso sobrevive ainda hoje em expressões como “filosofia natural”. Na
medida em que uma grande produção de conhecimento especializado em um
dado campo ia sendo conquistada, o estudo desse campo se desprendia da
filosofia, passando a constituir uma disciplina independente. As últimas
ciências que assim evoluíram foram a psicologia e a sociologia. Dessa
forma, poderíamos falar de uma tendência à contração da esfera da
filosofia na própria medida em que o conhecimento se expande.
Recusamo-nos a considerar filosóficas as questões cujas respostas podem
ser dadas empiricamente. Não desejamos com isso sugerir que a filosofia
poderá acabar sendo reduzida ao nada. Os conceitos fundamentais das
ciências, da figuração geral da experiência humana e da realidade (na
medida em que formamos crenças justificadas a seu respeito) permanecem
no âmbito da filosofia, visto que, por sua própria natureza, não podem
ser determinados pelos métodos das ciências especiais. É sem dúvida
desencorajador que os filósofos não tenham logrado maior concordância
com respeito a esses assuntos, mas não devemos concluir que a
inexistência de um resultado por todos reconhecido signifique que
esforços foram realizados em vão. Dois filósofos que discordem entre si
podem estar contribuindo com algo de inestimável valor, embora ambos não
estejam em condição de escapar totalmente ao erro: suas abordagens
rivais podem ser consideradas mutuamente complementares. O fato de
filósofos distintos necessitarem dessa mútua complementação torna
evidente que o ato de filosofar não é unicamente um processo individual,
mas também um processo que possui uma contrapartida social. Um dos
casos em que a divisão do trabalho filosófico se torna bastante
proveitosa consiste na circunstância de que pessoas distintas usualmente
enfatizam aspectos diferentes de uma mesma questão. Contudo, boa parte
da filosofia volta-se mais para o modo pelo qual conhecemos as coisas do
que propriamente para as coisas que conhecemos, sendo essa uma segunda
razão pela qual a filosofia parece carecer de conteúdo. No entanto,
discussões a respeito de um critério definitivo de verdade podem
determinar, na medida em que recomendam a aplicação de um dado critério,
quais as proposições que na prática deliberamos serem verdadeiras. As
discussões filosóficas da teoria do conhecimento têm exercido, ainda que
de modo indireto, importante efeito sobre as ciências.
UTILIZAÇÃO DA FILOSOFIA
Há uma questão que muita gente formula
de imediato quando ouve falar de filosofia: qual a utilidade da
filosofia? Não há certamente expectativa alguma de que ela contribua
para a produção de riqueza material. Contudo, a menos que suponhamos que
a riqueza material seja a única coisa de valor, a incapacidade da
filosofia de promover esse tipo de riqueza não implica que não haja
sentido prático em filosofar. Não valorizamos a riqueza material por si
própria – aquela pilha de papel que chamamos de dinheiro não é boa por
si mesma -, mas por contribuir para nossa felicidade. Não resta dúvida
de que uma das mais importantes fontes de felicidade, ao menos para os
que podem apreciá-la, consiste na busca da verdade e na contemplação da
realidade; eis aí o objetivo do filósofo. Ademais, aqueles que, em nome
de um ideal, não classificaram todos os prazeres como idênticos em seu
valor, tendo chegado a experimentar o prazer de filosofar, consideraram
essa experiência como superior em qualidade a qualquer outra. Visto que a
maior parte dos bens que a indústria produz, excetuando os que suprem
nossas necessidades básicas, valem apenas como fontes de prazer,
torna-se a filosofia perfeitamente apta, no que se refere à utilidade,
para competir com a maioria dos produtos industriais, quando poucos são
os que podem dedicar-se, em tempo integral à tarefa de filosofar. Mesmo
que entendêssemos a filosofia como fonte de um inocente prazer
particularmente válido por si próprio (obviamente, não apenas para os
filósofos, mas também para todos aqueles a quem eles ensinam e
influenciam), não haveria razão para invejar tão pequeno desperdício da
força humana dedicada ao filosofar.
Não esgotamos, porém, tudo o que pode
ser dito em favor da filosofia. Pois, à parte qualquer valor que lhe
pertença intrinsecamente acima de seus efeitos, a filosofia tem
exercido, por mais que ignoremos isso, uma admirável influência indireta
até mesmo sobre a vida de gente que nunca ouviu falar nela.
Indiretamente, tem sido destilada através de sermões, da literatura, dos
jornais e da tradição oral, afetando assim toda a perspectiva geral do
mundo. Em grande parte, foi através de sua influência que se fez da
religião cristã o que ela é hoje. Devemos originalmente a filósofos
idéias que desempenharam papel fundamental para o pensamento em geral,
mesmo em seu aspecto popular, como, por exemplo, a concepção de que
nenhum homem pode ser tratado apenas como um meio ou a de que o
estabelecimento de um governo depende do consentimento dos governados.
No âmbito da política, a influência das concepções filosóficas tem sido
expressiva. Nesse sentido, a Constituição norte-americana é, em grande
parte, uma aplicação das idéias do filósofo John Locke; ela apenas
substitui o monarca hereditário por um presidente. Similarmente,
admite-se que as idéias de Rousseau tenham sido decisivas para a
Revolução Francesa de 1789. É inegável que a influência da filosofia
sobre a política pode às vezes ser nefasta: os filósofos alemães do
século X1X podem ser parcialmente responsabilizados pelo desenvolvimento
de um nacionalismo exacerbado que posteriormente veio a assumir formas
bastante deturpadas. Todavia, não resta dúvida de que essa
responsabilidade tem sido freqüentemente muito exagerada, sendo difícil
determiná-la exatamente, o que se deve ao fato de aqueles filósofos
terem sido obscuros. Contudo, se uma filosofia de má qualidade pode
exercer influência nefasta sobre a política, com as filosofias de boa
qualidade pode ocorrer o contrário. Não há meios de impedir tais
influências sendo portanto extremamente oportuno que dediquemos especial
atenção à filosofia com o intuito de constatar se concepções que
exerceram alguma influência foram mais positivas do que nefastas. 0
mundo teria sido poupado de muitos horrores caso os alemães tivessem
sido influenciados por uma filosofia melhor que a dos nazistas.
Torna-se, portanto, imperativo abandonar
a afirmação de que a filosofia é destituída de valor, mesmo com
respeito à riqueza material. Uma boa filosofia, ao influenciar
favoravelmente a política, pode gerar uma prosperidade incapaz de ser
alcançada sob a égide de uma filosofia inferior. Outrossim, o expressivo
desenvolvimento da ciência, com seus conseqüentes benefícios de ordem
prática, muito depende de seu background filosófico. Houve
mesmo quem tenha chegado a afirmar, a nosso ver exageradamente, que o
desenvolvimento da civilização como um todo seria concomitante às
mudanças na idéia de causalidade, da concepção mágica de causalidade à
científica. De qualquer modo, a idéia de causalidade faz parte do objeto
da filosofia. A própria ‘perspectiva científica’, em grande parte, foi
introduzida inicialmente pelos filósofos.
Todavia, certamente não estaremos nas
melhores condições para fazer um estudo proveitoso da filosofia se a
encararmos principalmente como uma via indireta de acesso à riqueza
material. A principal contribuição da filosofia consiste no intangível background intelectual
do qual muito dependem o clima espiritual e a feição geral de uma
civilização. Nesse sentido, ocasionalmente se desenvolvem ambições ainda
maiores. Whitehead, um dos mais expressivos e acatados pensadores
modernos, descreve os dons da filosofia como “a capacidade de ver e de
prever, aliada a um sentido do valor da vida, ou seja, o sentido da
importância que anima todo esforço civilizado”.1 Acrescenta
ainda Whitehead que, “quando uma civilização atinge seu auge sem
coordená-lo com uma filosofia de vida, difundem-se por toda a comunidade
períodos de decadência e monotonia, seguidos pela estagnação de todos
os esforços”. Para ele, a filosofia consiste em “uma tentativa de
esclarecer as crenças que, em última instância, determinam nossa
atenção, a qual integra a base de nosso caráter”. De um modo ou de
outro, podemos ter como certo que o caráter de uma civilização é
enormemente influenciado por sua concepção geral da vida e da realidade.
Até pouco tempo, para a maioria das pessoas, essa concepção era
proporcionada pelo ensino religioso, mas as próprias concepções
religiosas foram muito influenciadas pelo pensamento filosófico.
Ademais, a experiência demonstra que as concepções religiosas podem
conduzir-nos à loucura, a menos que sejam continuamente submetidas a uma
avaliação racional. Os que rejeitam qualquer concepção religiosa devem
ter o maior interesse em elaborar uma nova concepção para, se possível,
substituir a crença religiosa. E fazê-lo significa engajar-se na
filosofia.
Embora não passa substituir a filosofia,
a ciência suscita problemas filosóficos. Pois ela não pode dizer-nos
que lugar ocupam os fatos com que lida no esquema geral das coisas, não
conseguindo nem mesmo esclarecer suas relações com os espíritos que os
observam. Nem mesmo pode demonstrar, embora deva admitir, a existência
do mundo físico ou a legitimidade do uso dos princípios da indução para
prever as prováveis ocorrências futuras ou ultrapassar de alguma forma o
que tem sido efetivamente observada. Nenhum laboratório científico pode
demonstrar em que sentido os homens têm uma alma, se o universo tem ou
não um propósito, se, e em que sentido, somos livres, e assim por
diante. Não desejamos com isso sugerir que a filosofia possa resolver
esses problemas; no entanto, se ela realmente não puder, nada mais
poderá fazê-lo, sendo certamente válido tentar descobrir ao menos se
tais problemas podem ser solucionados. Veremos, que a própria ciência
pressupõe continuamente conceitos que subsumem os domínios da filosofia
E, da mesma forma que nenhuma ciência pode florescer se não admitirmos
tacitamente uma resposta para certas questões filosóficas, não podemos
fazer uso mental adequado da ciência, com o intuito de implementar nosso
desenvolvimento intelectual, sem admitirmos uma visão de mundo mais ou
menos coerente. Mesmo as melhores conquistas da ciência moderna não
teriam sido alcançadas se os cientistas não tivessem adotado
determinadas suposições de grandes e originais filósofos, nas quais
basearam todo o seu proceder. A concepção “mecanicista” do universo, que
caracterizou a ciência durante os últimos três séculos, é derivada
principalmente do filosofia de Descartes. Por ter ocasionado
maravilhosos resultados, o esquema mecanicista deve ser, em parte,
verdadeiro, ainda que parcialmente inadequado, apressando-se o cientista
em buscar no filósofo o necessário auxílio para erigir novo esquema que
possa substituir o antigo.
Um segundo serviço inestimável prestada
pela filosofia (especialmente pela “filosofia crítica”) reside no
hábito, por ela estimulado, de promover-se um julgamento imparcial
considerando-se todas as facetas de uma questão, e na idéia que ela
oferece do que seja a evidência e de que devemos buscar ou esperar de
uma prova. Pode ser esse um importante questionamento das inclinações
emocionais e das conclusões precipitadas, sendo especialmente
necessário, e com freqüência negligenciado, em controvérsias políticas.
Se ambos os lados considerassem suas diferenças políticas munidos de
espírito filosófico, seria difícil admitir a eventualidade de uma
guerra. O sucesso da democracia depende muito da habilidade dos cidadãos
em distinguir um bom de um mau argumento, não se deixando enganar por
confusões. A filosofia crítica estabelece um padrão ideal para o
raciocínio correto e capacita quem a estuda a remanejar argumentos
confusos. Talvez seja esse a motivação pela qual Whitehead afirma, na
passagem acima citada, que “nenhuma sociedade democrática poderá
alcançar êxito sem que a educação geral que a inspire exprima uma
perspectiva filosófica”.
Na medida em que admitirmos que certa
cautela é desejável ao afirmarmos que os homens não deixam de viver de
acordo com uma filosofia na qual acreditam, e enquanto atribuirmos a
maior parte dos desacertos humanos exatamente à falta desse desejo de
sintonia com ideais mais nobres, não poderemos negar a extrema
relevância de crenças gerais a respeito da natureza do universo e do bem
para a determinação da progresso ou da degeneração da humanidade.
Algumas partes da filosofia inegavelmente produzem resultados práticos
mais expressivos, mas não devemos por isso incorrer no erro de supor que
a aparente inexistência de um suporte de ordem prática para determinado
campo de estudo implica que a investigação desse campo seja destituída
de sentido prático. Conta-se que um cientista, que costumava jactar-se
de desprezar a dimensão prática de toda pesquisa, disse certa vez a
respeito de uma: “0 melhor disso tudo é que ela possivelmente não
revelará qualquer utilidade prática para quem quer que seja.” Todavia,
essa linha de pesquisa acabou levando à descoberta da eletricidade. De
modo similar, estudos filosóficos por demais acadêmicos e aparentemente
destituídos de utilidade prática terminam por exercer profunda
influência sobre a visão de mundo, chegando até mesmo a afetar, em
última instância, a ética e a religião que adotamos. Pois as diferentes
partes da filosofia, os diferentes elementos que compõem nossa visão de
mundo, deveriam integrar-se. Tal é pelo menos o objetivo, nem sempre
alcançável, de uma boa filosofia. Sendo assim, conceitos à primeira
vista muito distanciados de qualquer interesse de ordem prática podem
vir a afetar de modo vital outros conceitos que envolvem mais de perto a
vida diária.
Podemos compreender agora o motivo pelo
qual a filosofia não precisa recear a questão de ter ou não valor
prático. Devo ao mesmo tempo dizer que não aprovo de modo algum uma
concepção puramente pragmática da filosofia. A filosofia merece ser
valorizada por si própria, e não por seus efeitos indiretos de ordem
prática. E a melhor maneira de assegurarmos esses bons efeitos práticos é
nos dedicarmos à filosofia pela filosofia. Para encontrar a verdade,
precisamos buscá-la desinteressadamente. E o fato de a encontrarmos se
revelará muito útil do ponto de vista prático. Não obstante, uma
preocupação prematura com seus efeitos práticos só dificultará nossa
busca do que é de fato verdadeiro. Muito menos podemos fazer desses
efeitos práticos o critério de sua verdade. As crenças são úteis porque
são verdadeiras, e não verdadeiras porque são úteis.2
PRINCIPAIS DIVISÕES DA FILOSOFIA
A seguinte classificação é usualmente aceita como uma especificação dos diversos assuntos que compõem a filosofia.
(1) Metafísica.3 Essa
disciplina é concebida como o estudo da natureza da realidade em seus
aspectos mais gerais, na medida em que podemos fazê-lo. Ela lida com
questões do seguinte tipo: De que modo a matéria se relaciona com o
espírito? Qual dos dois é anterior? São os homens livres? 0 que chamamos
de eu (self) é uma substância ou apenas uma seqüência de
experiências? É o universo infinito? Deus existe? Até que ponto o
universo é uma unidade ou uma diversidade? Até que ponto um sistema é
racional?
(2) Recentemente, a filosofia crítica
tem sido freqüentemente contraposta à metafísica (que nesse caso é às
vezes denominada filosofia especulativa). A filosofia crítica consiste
na análise e na crítica dos conceitos pertencentes ao senso comum e às
ciências. As ciências pressupõem certos conceitos que não são
suscetíveis de investigação por meio de métodos científicos, de modo que
passam a integrar o âmbito da filosofia. Nesse sentido, todas as
ciências, com exceção da matemática, pressupõem de alguma forma a
concepção de lei natural; cabe à filosofia, e não a qualquer das
ciências particulares, examinar tal concepção. De modo similar,
pressupomos, em nossos diálogos mais comuns e menos filosóficos,
conceitos fortemente imbuídos de problemas filosóficos, como matéria,
espírito, causa, substância e número. Uma importante tarefa da filosofia
consiste exatamente em analisar conceitos desse tipo, precisar o que
significam e determinar em que medida sua aplicação ao estilo do senso
comum pode ser justificada. A parte da filosofia crítica que trata da
investigação da natureza e dos critérios de verdade, assim como da
maneira pela qual obtemos conhecimento, é chamada de epistemologia
(teoria do conhecimento). Questões específicas desse campo são, entre
outras, as seguintes: Como podemos definir a verdade? Qual a distinção
entre conhecimento e crença? Podemos estar certos daquilo que sabemos’?
Quais as funções relativas do raciocínio, da intuição e da experiência
sensorial?
No presente trabalho, iremos ocupar-nos
desses dois ramos da filosofia , como constituindo sua parte filosófica
mais fundamental e característica. Apontaremos ainda algumas disciplinas
suplementares, que possuem certa afinidade com a filosofia na acepção
que lhe atribuímos neste livro, embora dela sejam distintas na medida em
que são dotadas de relativa autonomia. Esses são os ramos que
definiremos a seguir.
FILOSOFIA E DISCIPLINAS AFINS
(1) É difícil separar a lógica da
epistemologia. Mesmo assim, ela é normalmente considerada uma disciplina
autônoma. Trata-se de um estudo dos diferentes tipos de proposições e
de suas relações que justificam uma inferência. Certas partes da lógica
revelam acentuada afinidade com a matemática; outras poderiam igualmente
ser classificadas como pertencentes à epistemologia.
(2) A ética ou filosofia moral lida com
os valores e a problemática do “dever”. Ela formula questões como; Qual o
bem supremo? Qual a definição de bem? A retidão de um ato depende
unicamente de suas conseqüências? Nossos juízos sobre nossos próprios
deveres são subjetivos ou objetivos? Qual a função de um ato punitivo?
Qual a razão última pela qual não devemos mentir?
(3) A filosofia política consiste na
aplicação da filosofia (da ética principalmente) a questões relacionadas
com os indivíduos enquanto organizados sob a égide de um Estado. Ela
investiga questões do seguinte tipo: Um indivíduo possui direitos que
contrariam os interesses do Estado? Há no Estado algo mais além dos
indivíduos que o constituem? É a democracia a melhor forma de governo?
(4) A estética consiste na aplicação da
filosofia ao exame da arte e da noção de beleza. É típico da estética
formular questões do seguinte tipo: A beleza é objetiva ou subjetiva?
Qual é a função da arte? Para que aspectos de nossa natureza apelam as
diversas formas de beleza?
(5) 0 termo mais geral – teoria do valor
– é às vezes utilizado de modo a abranger o estudo dos valores
considerados em si mesmos, embora esse ramo possa ser incluído na ética
ou na filosofia moral. De qualquer modo, é sempre possível entendermos a
noção de valor como uma concepção geral cujas espécies e aplicações
particulares são desenvolvidas pelas disciplinas apresentadas nos itens
(2), (3) e (4).
A TENTATIVA DE EXCLUIR A METAFISICA EM FACE DA OBJEÇAO DE QUE MESMO A FILOSOFIA CRI’TICA A PRESSUPÕE
Diversas tentativas, algumas das quais
discutiremos posteriormente, foram feitas no sentido de excluir a
metafísica como injustificável e confinar a filosofia à sua versão
crítica e às cinco áreas afins que mencionamos, na medida em que podem
ser consideradas uma abordagem ou um estudo crítico dos conceitos da
ciência e da vida prática. Tal concepção foi ocasionalmente expressa
pela afirmação de que a filosofia consiste, ou deve consistir, na
análise das proposições do senso comum. É óbvio que tal afirmação,
quando se pretende exclusiva, chega a ser exagerada. Pois, (1) mesmo que
uma metafísica legítima e positiva não seja possível, haverá certamente
um campo de estudos que se ocupe da refutação dos argumentos falaciosos
que supostamente conduziriam a conclusões metafísicas; e tal campo
faria obviamente parte da filosofia. (2) A menos que as proposições do
senso comum sejam inteiramente falsas, sua análise deverá fornecer-nos
uma explicação geral daquela parcela da realidade à qual se referem as
proposições, ou seja, proporcionar, de algum modo, parte da explicação
geral do real que a metafísica busca oferecer. Nesse sentido, poderíamos
dizer que, se existir, o espírito – obviamente ele existe em certo
sentido – podemos obter uma metafísica do espírito a partir da análise
das proposições do senso comum relativas a nós mesmos, na medida em que
tais proposições são verdadeiras – de fato, seria difícil admitir que
todas as nossas proposições do senso comum acerca dos seres humanos
possam ser de todo falsas. Talvez não seja essa uma metafísica altamente
elaborada e de grande alcance, mas de qualquer modo envolverá genuínas
proposições metafísicas. Mesmo se afirmarmos que tudo que conhecemos é
apenas aparência, a aparência implica uma realidade que aparece e um
espírito para o qual ela aparece, e como estes não podem também ser
apenas aparências, estaremos ainda admitindo alguma metafísica. Até
mesmo behaviorismo é uma metafísica. Não desejamos com isso afirmar a
possibilidade atual ou mesmo futura de ,ama metafísica, no sentido de um
sistema elaborado que nos propicie grande dose de informação sobre a
estrutura geral da realidade e as coisas que mais desejamos conhecer.
Isso só pode ser feito ambulando, tentando-se estabelecer e criticar as
proposições metafísicas em questão. Não obstante, por mais que sejamos
apaixonadamente metafísicos, não passaremos sem a filosofia crítica. A
mera tentativa de dispensá-la acarretará a produção de uma metafísica
deplorável. Pois, mesmo na metafísica, devemos partir dos conceitos do
senso comum e das ciências, já que não dispomos de outros. Ademais, se
nossos fundamentos são seguros, devemos cuidadosamente analisá-los e
examiná-los. Dessa forma, não podemos separar totalmente a filosofia
crítica da metafísica, o que não impede um filósofo de atribuir muito
maior importância a um desses elementos.
A FILOSOFIA E AS CIÊNCIAS ESPECIAIS
A filosofia difere das ciências
especiais com respeito a (1) sua maior generalidade e (2) a seu método.
Ela investiga os conceitos que são supostos simultaneamente por inúmeras
ciências diferentes, além das questões que não se situam no âmbito das
ciências. A ciência compartilha com o senso comum os conceitos que
demandam essa investigação filosófica, mas as descobertas de uma ciência
particular suscitam ou intensificam alguns problemas especiais, como,
por exemplo, n da “relatividade”, que exigem um tratamento filosófico
por não poderem ser discutidos adequadamente pela ciência em questão.
Alguns pensadores, como Herbert Spencer, conceberam essencialmente a
filosofia como uma síntese dos resultados das ciências, mas hoje em dia
os filósofos, em geral, não adotam essa concepção. Sem dúvida, se
podemos obter resultados filosóficos através de processos de síntese e
generalização a partir das descobertas científicas, isso deveria ser
feito. Não obstante, o único modo de sabermos se podemos ou não fazê-lo é
tentar, e nesse ponto a filosofia não tem alcançado muito progresso nem
se revelado muito proveitosa. As grandes filosofias do passado
consistiram parcialmente numa investigação dos conceitos fundamentais do
pensamento, em tentativas de estabelecer fatos alegadamente distintos
daqueles com os quais lidava a ciência mediante métodos bastante
diferentes dos científicos. Elas comumente foram influenciadas, mais do
que parece, pelo estado contemporâneo da ciência, mas, sem dúvida, seria
muito enganador descrevê-las essencialmente como uma síntese dos
resultados da ciência. Mesmo filósofos antimetafísicos, como Hume,
estiveram mais voltados para os pressupostos da ciência do que para seus
resultados.
Tampouco devemos admitir sem reservas,
como uma verdade da filosofa, o resultado ou suposição científica válido
em sua própria esfera. Sabemos, por exemplo, que a física contemporânea
parece ter mostrado que o tempo da física é inseparável do espaço, o
que de modo algum nos autoriza a renunciar esse resultado como um
princípio filosófico pelo qual o tempo pressuporia o espaço. Pois, pode
ocorrer que o resultado em questão seja verdadeiro apenas com relação ao
tempo da física, e isso apenas porque o tempo da física é medido em
termos de espaço. Por conseguinte, não precisa ser verdadeiro com
relação ao tempo da nossa experiência, do qual o tempo da física é uma
abstração ou construção. A ciência pode progredir por meio de ficções
metodológicas usando termos num sentido invulgar que a filosofia tem de
corrigir. 0 termo filosofia da ciência é usualmente aplicado ao ramo da
lógica que lida de maneira especializada com os métodos das diversas
ciências.
0 MÉTODO DA FILOSOFIA COMPARADO AO MÉTODO CIENTÍFICO
Com respeito a seus métodos, a filosofia
difere fundamentalmente das ciências especiais. A não ser quando se
aplica a matemática, todas as ciências utilizam processos de
generalização empírica, mas a filosofia reserva a tal método um lugar
muito modesto. Por outro lado, a tentativa de assimilar a filosofia à
matemática, embora muito freqüente, não tem sido bem-sucedida (exceto em
determinados ramos da lógica que, pela própria natureza, têm mais
afinidade com a matemática do que com os demais setores da filosofia).
Particularmente, parece humanamente impossível que os filósofos possam
alcançar a certeza e a clareza que caracterizam a matemática. Essa
diferença entre os dois campos de estudo pode ser atribuída a várias
causas. Em primeiro lugar, não se tem mostrado possível determinar, em
filosofia, o significado dos termos do mesmo modo inequívoco que em
matemática. Assim sendo, seu significado pode mudar de forma quase
imperceptível ao longo de uma argumentação, sendo muito difícil nos
certificarmos de que diferentes filósofos utilizam a mesma palavra com o
mesmo sentido. Em segundo lugar, somente na matemática encontramos
conceitos simples formando a base de inúmeras inferências complexas e,
todavia, rigorosamente válidas. Em terceiro lugar, a matemática pura é
hipotética, ou seja, não nos pode dizer o que se passa no mundo real,
como, por exemplo, o número de coisas situadas num dado lugar, mas
apenas o que ocorrerá se isso for verdade, como, por exemplo, que
encontraríamos 12 cadeiras numa sala caso lá houvesse 5 + 7 cadeiras. A
filosofia, contudo, objetiva ser categórica, isto é, dizer-nos o que de
fato ocorre; conseqüentemente, em filosofia, não é apropriado, como
geralmente se faz em matemática, fazer deduções apenas a partir de
postulados ou definições.
Desse modo, é impossível encontrar uma
analogia adequada entre os métodos da filosofia e os de qualquer outra
ciência. É igualmente impossível definir de modo preciso qual é o método
da filosofia, a não ser limitando de forma grotesca o seu objeto. A
filosofia não emprega um método único, mas uma variedade de métodos que
diferem de acordo com o objeto ao qual são aplicados. E a tentativa de
defini-los de maneira independente de sua aplicação carece de qualquer
propósito útil. De fato, isso é muito perigoso. Ne passado, ela
freqüentemente conduziu a uma limitação equivocada do escopo da
filosofia, excluindo tudo aquilo que não se sujeitasse ao controle de
determinado método escolhido como caracteristicamente filosófico. A
filosofia requer grande variedade de métodos, pois deve abranger em sua
interpretação todo tipo de experiência humana. Não obstante, ela está
longe de ser meramente empírica, pois, tanto quanto possível, tem a
tarefa de apresentar uma imagem coerente dessas experiências e a partir
delas inferir o que pode ser inferido de uma realidade distinta da
experiência humana. No que se refere à teoria do conhecimento, deve a
filosofia submeter a uma crítica construtiva todas as modalidades de
pensamento; contudo, devemos reservar um lugar nessa visão para qualquer
modo de pensar que se nos apresente como autojustificado no que há de
melhor em nossas reflexões comuns, e não filosóficas, e não rejeitá-lo
por diferir dos outros. Os critérios filosóficos são, em linhas gerais, a
coerência e a abrangência; o filósofo deve visar a apresentação de uma
visão coerente e sistemática da experiência humana e do mundo, tão
esclarecedora quanto o permita a natureza dos casos investigados, mas
não deve buscar coerência à custa de rejeitar aquilo que de direito é
conhecimento real ou crença justificada. Uma séria objeção a uma
filosofia consiste na acusação de que ela sustenta algo em que não
podemos acreditar na vida cotidiana. Essa objeção poderia ser feita a
uma filosofia que logicamente conduzisse, como algumas, à conclusão de
que não há um mundo físico, ou de que todas as nossas crenças,
científicas ou éticas, carecem de qualquer justificação.
FILOSOFIA E PSICOLOGIA
Há uma ciência que mantém uma relação
bastante peculiar com a filosofia: a psicologia. Na prática, é muito
mais provável que as teorias psicológicas particulares venham a exercer
influência sobre um argumento filosófico ou, uma teoria a respeito do
bem e do mal do que as teorias particulares de uma ciência física também
válida a relação inversa: exceto com relação às partes que se aproximam
da fisiologia, a psicologia, mais do que qualquer setor particular da
física, corre o risco de sofrer as conseqüências adversas oriundas de um
equívoco de ordem filosófica. É provável que isso aconteça devido ao
fato de que apenas recentemente a psicologia emergiu como ciência
especial, ao contrário do que ocorreu com as ciências físicas, que há
muito já haviam alcançado posição estável, dispondo de bastante tempo
para esclarecer seus conceitos básicos de acordo com seus próprios
objetivos. Há uma geração, a psicologia era comumente ensinada por
filósofos, sendo muito difícil considerá-la uma ciência natural. Por
conseguinte, não teve tempo para completar o processo de esclarecimento
de seus conceitos fundamentais, necessário para torná-los, se não
filosoficamente inquestionáveis, suficientemente claros e úteis para a
prática da ciência em questão. 0 estado contemporâneo da física
sugere-nos que, quando uma ciência atinge um estágio mais avançado,
tende a se deparar mais uma vez com problemas filosóficos. Poderíamos
então afirmar que o período no qual uma ciência é independente da
filosofia não coincide com seu florescimento ou com os estágios mais
avançados de sua trajetória, mas com a longa fase que separa esses dois
extremos. Nesse sentido, a filosofia pode contribuir de algum modo para a
pendente reconstrução da física.
CETICISMO
Os filósofos têm-se preocupado muito com
uma criatura bastante estranha: o cético absoluto. Não obstante, tal
pessoa não existe. Se existisse, refutá-lo seria impossível.
Similarmente, ele não nos poderia refutar ou afirmar alguma coisa, nem
mesmo seu ceticismo, sem contradizer a si mesmo, pois a afirmação de que
nenhuma espécie de conhecimento ou crença pode ser justificada é uma
crença. Em contrapartida, também não poderíamos provar que o cético está
errado, na medida em que toda prova deve admitir algo, ainda que seja
alguma premissa, e também as leis da lógica. Se o princípio da
não-contradição não é verdadeiro, não podemos refutar algum mediante o
argumento de esse alguém está caindo em contradição. Um filósofo não
pode, portanto, partir ex nihilo e provar tudo: ele é forçado a
fazer certas suposições. Em particular, tem de admitir a verdade das
leis fundamentais da lógica, pois de outro modo não seria possível
utilizar argumentos de qualquer espécie ou mesmo formular quaisquer
enunciados significativos. Entre essas leis da lógica, assinalamos duas
que são muito importantes: trata-se dos princípios da não-contradição e
do terceiro excluído. Quando aplicados a proposições, o primeiro afirma
que uma proposição não pode ser ao mesmo tempo verdadeira e falsa,
enquanto o segundo afirma que toda proposição deve ser verdadeira ou
falsa. Quando os aplicamos a coisas, o primeiro afirma que uma coisa não
pode ser e não ser ao mesmo tempo ou ter e não ter uma qualidade ao
mesmo tempo, e o segundo, que uma coisa é ou não é e possui ou não uma
qualidade. Concordamos em que esses princípios não soam de modo a
entusiasmar ninguém, mas o fato é que todo nosso conhecimento e todo
nosso pensamento dependem deles. Se a afirmação de algo não excluísse
sua própria contradição, nenhum significado poderia ser atribuído a
qualquer asserção e ninguém poderia jamais ser contestado, na medida em
que tanto a asserção quanto a refutação poderiam ser corretas. Não
podemos negar que, em certos casos, pode ser equivocado atribuir ou não a
algo uma qualidade. Seria incorreto dizer que certas pessoas são ou não
calvas, não só devido à ausência de uma definição precisa do que seja
“calvo” mas também porque, na prática, “calvo” e “não-calvo” significam
extremos entre os quais reside uma classe intermediária de casos em que
não deveríamos aplicar um desses termos, e sim “parcialmente calvo” ou
“mais ou menos calvo”.
Não se trata, portanto, de uma pessoa
possuir ou não uma qualidade definida. Todas as pessoas são dotadas de
um grau particular de calvície, embora o uso dos termos “calvo” e
“não-calvo” não deixe claro a que graus de calvície desejamos
referir-nos. Tenho a impressão de que as objeções ocasionalmente feitas
ao princípio do terceiro excluído se escoimam em desentendimentos desse
tipo. De modo similar, o princípio da não-contradição é perfeitamente
compatível com o fato de um homem ser bom com relação a certo aspecto e
mau com relação a outro, ou mesmo com relação ao mesmo aspecto, ser bom
num momento e mau em outro.
A filosofia deve também aceitar a
evidência da experiência imediata , embora essa atitude não nos leve tão
longe quanto poderíamos esperar. Não dispomos normalmente de
experiência imediata sobre outros espíritos, a não ser o nosso, sendo
provável que a evidência da experiência imediata não possa dizer-nos que
os objetos físicos que parecemos experienciar existem independentemente
de nós mesmos. Tornaremos oportunamente a abordar essa questão. Logo
constatamos que, não obstante, deveremos fazer novas suposições, se
quisermos admitir que conhecemos certas coisas a respeito das quais a
vida cotidiana não oferece qualquer suporte para que possamos achar que
as conhecemos realmente. Todavia, não devemos concluir que a
impossibilidade de se justificar uma crença do senso comum mediante um
argumento implica necessariamente sua falsidade. Pode ser que, no nível
do senso comum, possuamos um conhecimento genuíno ou uma crença
justificada que seja por si próprio estabelecido e que dispense uma
justificação filosófica. Não cabe ao filósofo, nesse caso, provar a
verdade da crença, pois isso pode ser impossível, mas dar-lhe a melhor
explicação possível, examinando acuradamente aquilo que ela envolve, Se
usarmos a expressão “crença instintiva” para denominar aquele tipo de
crença que tomamos como evidentemente verdadeira antes de qualquer
crítica filosófica, e que continua a parecer evidentemente verdadeira em
nossa vida cotidiana após a crítica filosófica e a despeito dela,
podemos afirmar com Bertrand Russell – que não pode certamente ser
acusado de credulidade demasiada – que a única razão para rejeitar uma
crença instintiva é o fato de ela colidir com outras crenças
instintivas, sendo um dos principais objetivos da filosofia produzir um
sistema coerente baseado em nossas crenças instintivas, corrigindo-as o
menos possível e só para preservar sua coerência. Nesse sentido, já que a
teoria do conhecimento só pode basear-se num estudo das coisas reais
que conhecemos e da maneira pela qual as conhecemos, podemos afirmar que
o fato de uma teoria filosófica em particular levar à conclusão de que
não podemos conhecer certas coisas que evidentemente conhecemos, ou que
não podemos justificar certas crenças que obviamente são justificadas, é
mais uma objeção à teoria filosófica em questão que ao conhecimento ou
às crenças que ela questiona. Por outro lado, seria tolice supor que
todas as crenças do senso comum devem ser verdadeiras da maneira como se
nos apresentam. Talvez seja função da filosofia aperfeiçoá-las, mas não
descartá-las, ou alterá-las de modo a torná-las irreconhecíveis.
FILOSOFIA E SABEDORIA PRÁTICA
A filosofia está associada tanto ao
saber teórico quanto à sabedoria prática, à qual aludimos através de
expressões do tipo “considerar filosoficamente as coisas”. De fato, o
sucesso da filosofia teórica não nos oferece qualquer garantia de que
seremos filósofos no sentido prático ou de que agiremos e sentiremos de
modo correto sempre que nos envolvermos em determinadas situações
práticas. Uma das doutrinas favoritas de Sócrates é a de que sempre
podemos fazer o bem desde que saibamos o que é o bem; não obstante, isso
só é verdade se acrescentamos ao significado do termo “saber” uma
adequada nitidez emocional daquilo que sabemos do ponto de vista
teórico. 0 fato de sabermos (ou acreditarmos) que fazer algo que
desejamos iria acarretar muito mais sofrimento a uma outra pessoa – o
Sr. A – do que prazer para nós mesmos, sendo, em conseqüência,
não-recomendável, não nos impede, todavia, de praticar tal ação, pois a
idéia de causar sofrimento ao Sr. A poderia parecer-nos menos repugnante
que a de perdermos aquilo que cobiçamos. Na medida em que é
inteiramente impossível a qualquer ser humano sentir o sofrimento alheio
com a mesma intensidade que os seus, ocorre sempre a possibilidade de
sermos tentados a abandonar nossos deveres, fazendo-se necessário não
apenas o conhecimento, mas também o exercício da vontade. Nem somos
constituídos de modo a ser sempre fácil, quando somos abandonados à
nossa própria moral, nos opormos a um forte desejo, ainda que disso
dependa nossa própria felicidade. A filosofia não é garantia de nossa
conduta correta ou do perfeito ajustamento de nossas emoções às nossas
crenças filosóficas. Nem mesmo do ponto de vista cognitivo é ela capaz
de nos dizer o que devemos fazer. Para isso, precisamos, além de
princípios filosóficos, não só do conhecimento empírico dos fatos
relevantes e da capacidade de prever as prováveis conseqüências, mas
também de um insight da situação particular, de maneira a podermos aplicar adequadamente nossos princípios.
Obviamente, não é minha intenção afirmar
que a filosofia não contribui para vivermos uma vida exemplar, mas
apenas que não pode por si só levar-nos a viver de modo exemplar nem
decidir o que seja esse tipo de vida. Insisto, entretanto, em que ela
pode, a esse respeito, pelo menos proporcionar valiosas sugestões. E
teria muito mais a dizer sobre a conexão entre filosofia e vida
exemplar, se incluísse neste livro uma discussão especial da ética,
disciplina filosófica que trata do bem e da ação correta. Não obstante,
devemos fazer uma distinção entre filosofia teórica, enquanto explicação
do que é, e ética filosófica, enquanto explicação do bem e da ação
correta.
Não pretendo, ao recorrer a essa
ilustração, dar a impressão de ser um hedonista, ou uma pessoa
convencida de que o prazer e a dor sejam os únicos fatores relevantes
para que se possa julgar uma ação boa ou má. Não sou assim.
A metafísica ou a filosofia crítica nos é
de pouca valia para decidirmos o que devemos fazer. Pode levar-nos a
conclusões que facilitem encararmos as adversidades de maneira mais
serena, mas isso depende da filosofa, não havendo infelizmente acordo
universal entre os filósofos quanto à possibilidade de uma concepção
otimista do mundo ser justificada filosoficamente. No entanto, devemos
seguir a verdade aonde quer que ela nos leve, já que nosso espírito, uma
vez desperto, não pode apoiar-se no que carece de justificativa, pois o
pensamento não pode ser uma falsidade. Ao mesmo tempo, devemos estudar
atentamente e não recusar-nos a ouvir as alegações dos que pensam ter
alcançado, mediante recursos que não podem ser incluídos nas categorias
usuais do senso comum, verdades inspiradoras e reconfortantes a respeito
da realidade. Não devemos tomar como certo que as pretensões de uma
cognição genuína em matéria de experiência místico-religiosa, com
relação a um diferente aspecto da realidade, devam ser necessariamente
descartadas coma carentes de justificativa apenas por não se ajustarem a
um materialismo sugerido, mas de modo algum provado e, agora, nem mesmo
sustentado pela ciência moderna.
1 Whitehead, A. N., Adventures of Ideas, pg. 125.
2 Nossa crítica à atitude “pragmatista” encontra-se nas pgs. 53-4 e 63-4 adiante.
3 Esse termo tem origem no fato de ter sido discutido na obra de Aristóteles que foi colocada após (meta) seu trabalho sobre a física.
Whitehead, A. C.: The Function of Reason, Princeton: Princeton University Press.
(texto escaneado por Marco Antonio Frangiotti de Ewing, A. C. (1984):
As Questões Fundamentais da Filosofia, Rio de Janeiro: Zahar, pgs. 11-25)
Fonte:www.cfh.ufsc.br
(Texto disponível em http://www.pedagogiaaopedaletra.com.br/posts/o-que-e-filosofia-e-por-que-vale-a-pena-estuda-la/ )
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