RESENHA: O MITO DA CAVERNA
Quantas vezes julgamos as coisas apenas
pela imagem que vemos nelas? Muitas vezes nós nos deixamos levar pelas
aparências e não procuramos saber qual é o real significado das coisas.
Nos primórdios, nossos antepassados viviam em uma cultura empírica, o
modo como eles plantavam, criavam animais e viam os fenômenos da
natureza era apenas baseado na observação. Assim, sabiam quando poderia
chover, qual era a melhor época para se plantar determinado vegetal,
como curar os animais de certas doenças, mas não sabiam por quê. Somente
sabiam que, se cumprissem certos procedimentos, percebidos por eles ou
transmitidos pelos mais velhos da tribo, poderiam resolver os problemas
que lhes surgiam. A cultura baseada no empirismo não trouxe grandes
progressos para a humanidade, não é uma cultura que procura questionar,
apenas leva o homem a observar fenômenos e, pela repetição deles,
permite que se possa tirar conclusões.
Ao longo do tempo, alguns homens
começaram a se questionar sobre o porquê dos fenômenos naturais, porquê
chovia, porquê o sol nascia e se punha todos os dias, e passaram a
observar os fenômenos de forma científica, procurando saber como e
porquê eles aconteciam. Assim, o homem foi desenvolvendo cada vez mais
as tecnologias, originadas da cultura científica.
Mas não é porque estamos no século XXI,
com todo o progresso tecnológico que podemos dizer que estamos livres da
cultura empírica, que estamos todos munidos do saber científico. A
maioria das pessoas não vê o mundo de forma científica, apenas aceita as
informações que recebe através de outros ou através dos veículos de
comunicação e as tomam como verdades indiscutíveis, sem procurar
refletir se essas informações são verdadeiras ou não, e qual a sua
profundidade. Foi desse modo que certas teorias se tornaram dogmas por
séculos, até que alguém começasse a se perguntar se eram verdadeiras ou
não. Tomemos como exemplo as teorias sobre o universo. O homem passou
séculos acreditando que a Terra era o centro do universo, assim como
julgava ser impossível que a Terra fosse redonda, sem nunca terem feito
cálculos ou experimentos para comprovar esses fatos. Essas “verdades”
eram aceitas por todos, ninguém pensava que pudesse ser de modo
diferente, ninguém se perguntava porquê era daquele modo, já que nunca
tinham comprovado esses dogmas. Até que alguns estudiosos refletiram
sobre a idéia e começaram a questionar se tudo aquilo que eles tinham
aprendido era verdade. No início, esses estudiosos foram massacrados
pela sociedade, foram chamados de bruxos e alguns até foram condenados à
morte. Ao longo do tempo, as pessoas começaram a perceber o mundo de
forma diferente, os estudiosos conseguiram convencer a sociedade de suas
convicções e muitas dessas teorias que eram tidas como dogmas foram
quebradas para dar espaço a outras, que tinham melhores propostas.
Com o conhecimento empírico nunca
poderia o homem imaginar que a Terra era redonda, sem estudos
científicos sobre o assunto, é difícil imaginar que vivemos “de cabeça
para baixo” com relação ao universo, que todos os dias a Terra gira em
torno do seu eixo para que ocorram os fenômenos do dia e da noite.
Somente com profundos estudos científicos se pôde afirmar isso. Mesmo os
fenômenos que podemos saber que ocorrem, como os fenômenos das marés,
nunca poderíamos explicá-los baseados no empirismo.
Entretanto, a passagem do empírico para o
científico não é fácil, não se aprende nada imediatamente e sem um
mínimo de esforço. Desse modo ocorre na alegoria do Mito da Caverna,
de Platão. Assim como os homens que estavam enclausurados na caverna,
sem poderem se movimentar, somente com uma forte luz atrás de si, vendo
as sombras que refletiam na parede da caverna, a sociedade estava e está
de muitas formas na escuridão, no que se refere ao saber científico.
Para que o homem que foi libertado da escuridão se ambientasse com a luz
levou tempo, e teve de ser aos poucos. Assim, para que possamos sair da
escuridão para encontrar a luz do saber científico, temos que nos
esforçar, nos ambientar aos poucos com esse saber, que à primeira vista é
ofuscante e confunde nossas idéias, mas ao longo do tempo vamos nos
acostumando e percebendo que o pensamento que tínhamos anteriormente era
completamente limitado. As dificuldades na transição do saber empírico
para o saber científico fazem com que muitos desistam, mas os que
conseguem ultrapassar essa fase nunca mais querem voltar à escuridão.
Muitos que estão privados do saber
científico às vezes pensam que tudo sabem, que o conhecimento que
possuem é suficiente para que tudo entendam. No Mito da Caverna,
os homens que lá viviam achavam que a realidade da caverna era a única
que existia, que as sombras eram seres, alguns ainda se comunicavam, a
visão que eles tinham da realidade era completamente distorcida do real.
E isso não ocorre somente com os prisioneiros de Platão, mas também com
os que negam o saber científico, com os que nada sabem e pensam que
tudo sabem. A prova disso é que quanto mais uma pessoa se aprofunda no
estudo filosófico ou de qualquer outra área, mais ela descobre que ainda
tem muito a conhecer. Isso porque passa a conhecer outras realidades,
não somente a que estava acostumado. E quanto mais realidades descobre,
mais percebe que tem muito a aprender.
O filósofo, que procura mostrar a luz do
saber aos outros, muitas vezes é criticado e sofre repreensões físicas e
morais, é chamado de sonhador, de ser que está fora da realidade e no
passado era até castigado fisicamente. Tudo isso por perceber a
realidade dos fatos de maneira clara, ao passo que os outros se mantém
na escuridão do saber empírico. Muitos negam o saber científico, talvez
pelas dificuldades que surgem à medida que vão descobrindo-o, talvez por
achar mais cômodo permanecer sem o total conhecimento das coisas para
não se preocupar demais com as coisas do mundo. Assim, as pessoas deixam
de aproveitar de tudo o que o saber científico pode proporcionar para
ficar preso nas limitações do saber científico.
Devemos perceber que, de certa forma,
estamos também na escuridão como os prisioneiros de Platão, quando
somente assistimos ao que se passa na televisão e nos outros meios de
comunicação sem procurar questionar se os fatos narrados, que muitas
vezes são manipulados, estão munidos de total clareza. Muitas vezes não
nos perguntamos se o que aprendemos, mesmo nas escolas e universidades é
verdadeiro, se não estamos nos limitando somente à esfera do que os
professores passam, sem buscar outras fontes de conhecimento, como a
leitura. Não se pode ficar restrito a uma só realidade, preso pelos que
manipulam a mente da sociedade, não se pode ver os fatos de um só
ângulo, deve-se refletir e pensar sobre o que nos é passado, para que
não fiquemos eternamente presos na escura caverna do saber empírico e
recebamos a luz do verdadeiro saber.
Autor: Marcelo
(Texto disponível em http://www.pedagogiaaopedaletra.com.br/posts/resenha-mito-caverna-2/?utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=resenha-mito-caverna-2 )
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